Estamos em outra onda. A taxa de testes de Covid positivos já se compara à da onda de janeiro. Duas ondas movidas por variantes com escape imune suficiente para serem muito transmitidas. Felizmente, hospitalizações e mortes ainda não chegam perto dos números do começo do ano. Mas já registramos mais de 54 mil vidas perdidas para a Covid em 2022. Em 2020, as mortes por doenças virais como dengue, febre amarela e HIV somaram menos de 14 mil, segundo o Sistema de Informações sobre Mortalidade.
Com o abandono precoce das máscaras, a vacinação virou a única barreira contra o vírus. Dada nossa situação atual, sem nem uma estratégia federal de combate à Covid, parece utópico dizer que temos condições de ver números muito melhores daqui em diante. Mas ainda podemos ter uma posição central no desenvolvimento e teste de vacinas com potencial de controlar muito mais a doença, como vacinas de RNA, de spray nasal e vacinas universais.
Já aplicamos mais de 1 bilhão de doses de vacinas de RNA pelo mundo. Elas têm excelente perfil de segurança e proteção. O risco de miocardite em vacinados é raro, tende a se resolver em dias e é muito menor do que entre quem tem Covid. Das vacinas em uso, são as mais "atualizáveis" para contornar o escape imune. Como usam um trecho do material genético do vírus, ele pode ser revisto para representar novas variantes.
São as vacinas de RNA que estão em estágio mais adiantado de testes com doses específicas para a ômicron. Mas esses testes não têm sido rápidos o suficiente. Os testes mais avançados foram feitos com a variante ômicron de janeiro e a linhagem BA.5 em circulação agora já escapa parcialmente delas.
Precisaríamos encurtar o tempo entre observar o vírus e vacinar para alguns meses. E o Brasil tem infraestrutura e mão de obra qualificada para participar disso, como Chile e Israel fazem.
As vacinas de spray nasal podem ser baseadas em várias estratégias, como o RNA. O importante é o local de aplicação. A aplicação intranasal desperta anticorpos e a ativação de células imunes da mucosa nasal, região que o coronavírus coloniza primeiro. Essa imunidade localizada pode barrar a entrada do vírus no corpo. Assim, vacinados nem transmitiriam o vírus.
O spray dispensa agulhas, é mais barato e ainda pode ser mais bem aceito, especialmente para doses regulares. Nossos centros de pesquisa têm condições de desenvolver e produzir esse tipo de vacina, o que é especialmente interessante para o suprimento constante de doses renovadas.
Já as vacinas mais universais são o Santo Graal para doenças como a Covid e a gripe. Idealmente, seriam feitas com base em regiões conservadas e importantes que o vírus não pode mudar com facilidade, o que tem o potencial de induzir uma imunidade eficaz contra os vírus atuais e futuros. Seriam vacinas que nos protegem até contra outros coronavírus que não conhecemos e poderiam ter evitado a Covid como um todo se já estivessem disponíveis.
Essa seria a barreira definitiva e todo país com pesquisa em saúde pública como o Brasil deveria se mobilizar para viabilizá-la. Isso se o governo federal estivesse interessado em usar nossa infraestrutura e expertise para realmente promover a vacinação e salvar vidas. Os índices baixos de vacinação infantil e o corte absurdo de verba da ciência mostram que não é o caso.
Sair da pandemia depende de atitudes coletivas e da ciência. E é um caminho que ainda deve levar anos. Por isso, o voto que faremos logo deve levar isso em conta. Voltar a valorizar e investir na ciência no Brasil seria um dos passos para que nosso novo normal seja mais normal ainda.
Esta coluna foi escrita para a campanha #ciêncianaseleições, que celebra o Mês da Ciência.
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