Bernardo Guimarães

Doutor em economia por Yale, foi professor da London School of Economics (2004-2010) e é professor titular da FGV EESP

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Bernardo Guimarães
Descrição de chapéu Copa do Mundo 2022

Na torcida para a nossa seleção ser nossa

A ideia de que a Copa pode ajudar a unir o Brasil tem respaldo acadêmico

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A Copa do Mundo começa com o Brasil dividido em tribos políticas. Pode a Copa amenizar essa polarização e reduzir o escopo para conflitos? A torcida pela seleção pode fazer com que nós nos vejamos um pouco mais como brasileiros e um pouco menos como membros da tribo?

Artigo acadêmico de Emilio Depetris-Chauvin (PUC-Chile), Ruben Durante (ICREA, Barcelona) e Filipe Campante (Johns Hopkins), publicado no American Economic Review em 2020, coloca uma resposta otimista a essa pergunta.

Os autores estudam como as seleções de futebol dos países africanos afetam a identificação das pessoas com o país e a possibilidade de conflitos étnicos.

Bolsonaristas em manifestação antidemocrática no Comando Militar do Sudoeste, na região do Parque Ibirapuera, em São Paulo - Karime Xavier/Folhapress

Muitos países da África abrigam múltiplas etnias, e conflitos por vezes ocorrem. Além disso, há uma edição da Copa Africana de Nações a cada 2 anos. Isso faz do continente uma boa fonte de dados para análises estatísticas que buscam entender efeitos em conflito e identidade.

O artigo começa comparando respostas a questionários logo antes e logo depois de um jogo de futebol. Quando a seleção do país vence, há uma redução no número de pessoas que se sente fortemente identificado com o grupo étnico. Cresce a identificação das pessoas com o país.

Além disso, uma vitória da seleção nacional também leva as pessoas a reportarem mais confiança em pessoas de outras etnias.

Mas será que essas respostas a questionários se traduzem em ações?

A segunda parte do artigo estuda como triunfos da seleção nacional afetam conflitos. Usando técnicas estatísticas, eles comparam países que se classificaram para a Copa Africana de Nações por pouco, com países que quase se classificaram mas ficaram de fora.

A classificação para a Copa Africana de Nações está associada a uma redução na quantidade reportada de conflitos. O número de ocorrências cai em quase 10%.

Futebol, claro, não resolve os problemas, mas o estudo indica que triunfos da seleção ajudam um pouco a unir o país.

Um exemplo frequentemente citado de influência da seleção de futebol nos conflitos e na política de um país é a qualificação da Costa do Marfim para a Copa do Mundo de 2006.

Em 2002, o país tinha chegado ao ponto de guerra civil. Os conflitos armados não duraram muito, mas as tensões persistiam. Assim estava o país em 2005, quando a seleção conseguiu uma dramática qualificação para a Copa.

No vestiário, o artilheiro e estrela do time Didier Drogba, grande homem de movimento, fez um discurso de um minuto que entrou para a história. Junto com os outros jogadores, ele pedia que seus conterrâneos perdoassem uns aos outros, buscassem paz e realizassem eleições.

Claro que isso não encerrou conflitos e trouxe paz ao mundo.

Mas acredita-se que a vitória de uma seleção com integrantes dos diferentes grupos do país, junto com o apelo por paz, fez com que pessoas passassem a se identificar um pouco mais com o país e um pouco menos com seu grupo. Isso teria reduzido a disposição para conflito.

O trabalho de Depetris-Chauvin, Durante e Campante mostra que os dados corroboram essas crenças.

Os autores também mostram que os efeitos dependem de características do país e da seleção nacional. É difícil saber como será o efeito no Brasil de hoje. Mas para mim, isso traz mais um motivo para torcer pela seleção.

Seria muito legal que com a Copa do Mundo, a camisa da seleção canarinho voltasse a representar o país inteiro.

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