Bernardo Guimarães

Doutor em economia por Yale, foi professor da London School of Economics (2004-2010) e é professor titular da FGV EESP

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Bernardo Guimarães
Descrição de chapéu indústria

Precisamos acabar com a chamada desoneração

A desoneração poderia ser chamada de Menos Médicos e de Brasil Menos Produtivo

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Está em discussão uma medida que deixa mais onerosa a folha de pagamentos para setores da economia responsáveis por dezenas de milhões de empregos formais. De acordo com essa medida, esses empregadores pagariam mais impostos sobre os salários de seus funcionários que outros 17 setores da economia.

Impostos sobre os salários de profissionais envolvidos com educação, saúde, alimentação e comércio, por exemplo, seriam maiores que os impostos sobre os salários de quem trabalha em call centers e na indústria automotiva ou têxtil, para citar alguns setores.

A medida é chamada de desoneração da folha de pagamento. Afinal, de acordo com essa medida, empresas de 17 setores, que empregam 9 milhões de pessoas, estariam sujeitas a regras de tributação mais favoráveis.

Essa tal desoneração foi criada em 2011, nunca deveria ter existido e precisa acabar. O presidente finalmente vetou sua prorrogação, agora o Congresso discute se deve derrubar o veto. Não deve.

As associações das empresas beneficiadas pela medida argumentam que ela reduz o custo do trabalho formal e, portanto, estimula o emprego nesses setores. O fim da desoneração pode levar a demissões.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, durante pronunciamento à imprensa - Jardiel Carvalho - 24.nov.23/Folhapress

Isso é verdade.

Assim como é verdade que o imposto maior sobre os outros desestimula o emprego nos setores de educação, saúde, comércio, alimentação etc.

Ah, mas o que está sendo discutido é a redução de imposto para alguns, não o aumento para os outros –diriam os defensores da tal desoneração.

Pega na mentira, corta o rabo dela.

Se alguns pagam menos impostos, outros têm que pagar mais para a conta fechar. Ou o governo emite dívida, que precisa ser paga futuramente, com dinheiro proveniente de impostos, ou o Estado tem menos recursos para investir.

Eu sou completamente a favor de desonerar a folha de pagamentos. Para todos! Não para as associações com maior poder político para conseguir benefícios.

Para reduzir os encargos trabalhistas, é preciso aumentar outros impostos ou cortar alguns gastos. Essa questão é importante, mas hoje vou focar nos efeitos desse regime tributário privilegiado para 17 setores da economia.

Parte da oposição ao privilégio desses 17 setores vem de um sentimento de injustiça. Por que contratar professores deve ser mais oneroso que contratar engenheiros?

É, porém, interessante pensar nos efeitos de medidas como essa na economia como um todo.

Para decidir se vale a pena contratar alguém, as empresas comparam os custos dessa contratação (salários, impostos) com os ganhos de ter essa pessoa trabalhando na empresa.

Se os impostos são iguais em todos os setores, a tendência é que as pessoas trabalhem onde geram mais ganhos, ou seja, onde são mais produtivas. Esse processo é imperfeito, cheio de incertezas e fricções, mas a competição entre as empresas por trabalhadores empurra o mercado de trabalho nessa direção.

Contudo, empresas que tem direito de pagar menos impostos competem com vantagem no mercado de trabalho. Elas podem oferecer salários competitivos mesmo que os ganhos gerados por um novo funcionário sejam menores que em outras empresas.

Assim, essa desigualdade no imposto faz com que algumas pessoas sejam alocadas em empregos com produtividade menor. A "desoneração", portanto, poderia ser chamada de "Menos Médicos" e de "Brasil Menos Produtivo".

Além disso, privilégios como esse estimulam lobbies e a sensação de que quem não chora não mama, de que as leis são para os fortes. Precisamos de regras simples e justas. A desoneração vai na contramão desse objetivo.

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