Bernardo Guimarães

Doutor em economia por Yale, foi professor da London School of Economics (2004-2010) e é professor titular da FGV EESP

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Bernardo Guimarães
Descrição de chapéu indústria

Novo plano para a indústria é ruim, sim

Estímulos deveriam se basear em estudos de impacto, sem interferência dos beneficiados

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

O plano do governo de estímulo à indústria foi criticado por muitos economistas (como eu). Alguns comentaristas julgaram as críticas exageradas.

Destaco dois argumentos por trás dessa visão moderada. O primeiro é o de plausibilidade. O estímulo a esses setores poderia funcionar, seria cedo para avaliar. Afinal, e aí entra o segundo argumento, há política industrial no mundo todo, inclusive em países desenvolvidos, por que não no Brasil?

Começo pelo segundo.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva participa de Reunião do Conselho Nacional do Conselho Industrial; na imagem, as ministras Nísia Trindade e Luciana Santos esperam para tirar foto com presidente enquanto ele reclama do microfone
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva participa de Reunião do Conselho Nacional do Conselho Industrial - Gabriela Biló/Folhapress

Outros países fazem política industrial, mas não necessariamente porque a sociedade se beneficia. Em parte, fazem porque há lobbies. Medidas protecionistas recentes podem ter contribuído para a queda na produtividade no mundo desenvolvido.

Além disso, cada país tem seu cenário econômico. Por exemplo, o efeito de proteção industrial na desigualdade de renda é diferente nos países ricos, onde importações chinesas concorrem com o trabalho dos mais pobres.

Por fim, política industrial é um termo que abrange uma vasta gama de medidas. Por exemplo, países asiáticos, frequentemente citados como casos de sucesso, estimularam setores exportadores. Esses exemplos não deveriam inspirar políticas de substituir importações e reduzir fluxos de comércio.

Então, precisamos examinar as políticas de estímulo propostas no Brasil e a nossa realidade. Isso nos traz ao primeiro argumento.

É plausível que despejar alguns bilhões de dólares para fomentar turismo gere receita e empregos que compensem todo o investimento feito. Afinal, temos uma natureza maravilhosa, comida boa, um povo simpático, por que temos que ser anões no turismo internacional?

É plausível que investir no campeonato brasileiro de futebol gere retornos enormes. A Inglaterra recebe uns R$ 15 bilhões por ano apenas pelo direito de mostrarem os jogos em outros países. Lucro puro. Por que o Brasil, o país mais identificado com o futebol, com estádios e times icônicos, não poderia ter o melhor campeonato do planeta, com os maiores craques (Neymar, Vinicius Jr, Rodrigo Nestor)? Arrecadaríamos bilhões em royalties.

Do mesmo modo, muitos acham plausível que investir na construção de navios seja muito lucrativo. Fazemos aviões, navegar é preciso, por que não devemos fomentar a indústria naval?

Nada disso justifica subsídio algum. As perguntas difíceis começam aqui: por que o setor privado não faz os investimentos necessários apesar dos altos retornos ao investimento?

Falta infraestrutura? Segurança? Aí, a melhor política não é subsidiar a indústria.

Seria porque esses setores vão gerar ganhos e lucros para outros setores da economia (as externalidades positivas)? Como medir isso? Há alguma evidência empírica?

Por que construir navios gera tantas externalidades positivas?

Idealmente, políticas de estímulos se baseariam em estudos de avaliação de impacto, sem interferência dos representantes dos setores que se beneficiaria do plano. Não foi isso que aconteceu.

As políticas de estímulo foram traçadas a partir do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CDNI), composto por representantes de ministérios, pelo BNDES e por representantes da "sociedade civil".

Os representantes da "sociedade civil" poderiam ser associações dos clubes de futebol, dos vendedores de fitinhas do Senhor do Bonfim, ou dos fabricantes de veículos e embarcações. Esses últimos estão no CDNI, os outros não estão. E os estímulos irão para carros e navios.

Essa não é uma maneira razoável de alocar recursos públicos, e não só porque existe corrupção no país.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.