Jornalista, assina a coluna Brasília. Na Folha, foi correspondente em Londres e editor interino do 'Painel'.
Delatado e indignado
BRASÍLIA - Michel Temer recorreu a uma velha tática para rebater a delação de Sérgio Machado. Apontado como beneficiário do esquema de corrupção na Petrobras, o presidente interino se disse indignado e passou a acusar o acusador. Apresentou-se como vítima de um depoimento "irresponsável", "leviano", "mentiroso" e "criminoso".
"Eu falo em primeiro lugar como homem, como ser humano", disse Temer, com o dedo indicador em riste. "Quero me dirigir à minha família, quero me dirigir aos muitos amigos e conhecidos que tenho no Brasil", prosseguiu. "Esta leviandade não pode prevalecer", continuou.
Sobrou retórica, mas faltou esclarecer o teor das acusações. Temer se recusou a responder perguntas e saiu apressado assim que terminou a declaração oficial. Deixou de falar sobre questões como o relato da propina de R$ 1,5 milhão, o encontro na base aérea de Brasília e as ligações com o ex-presidente da Transpetro, novo homem-bomba da Lava Jato.
Quem ouviu o presidente interino se referir ao acusador como "senhor Machado" pode ter ficado com a impressão de que os dois se conhecem de vista. Não é bem assim. Delator e delatado são correligionários há uma década e meia. Temer comanda o PMDB desde 2001. O ex-senador se filiou ao partido no mesmo ano.
O Planalto preparava um pronunciamento para a noite desta sexta, em cadeia de rádio e TV. A ideia era evitar os problemas da Lava Jato e vender um discurso otimista sobre a economia, como se o governo se limitasse ao Ministério da Fazenda. Machado melou o plano, e Temer precisou antecipar a fala. Pelo menos escapou do apitaço que já começava a ser organizado nas redes sociais.
Antes de se despedir, o presidente disse que a delação não iria "embaraçar a atividade governamental". A promessa durou pouco. Horas depois, anunciou-se a queda de seu terceiro ministro alvejado pela Lava Jato. Um embaraço e tanto para quem está há apenas 36 dias no cargo.
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