Bia Braune

Jornalista e roteirista, é autora do livro "Almanaque da TV". Escreve para a Rede Globo.

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Bia Braune
Descrição de chapéu
maternidade

Entre homens e meninos, reina o pressuposto de que é preciso gostar de futebol

Botei no mundo a prova viva dessa máxima, um adorável serzinho de sete anos incapaz de chutar uma bola

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Tem de tudo: Copa do Mundo, Brasileirão, Copa do Brasil, Libertadores. Agora mesmo, enquanto rola a Eurocopa, não falta gente fazendo gol até na pracinha aqui perto de casa. No entanto, a regra é clara. Não importa a magnitude do certame: menino que não gosta de futebol será sempre humilhado.

Botei no mundo a prova viva dessa máxima. Um adorável serzinho de sete anos, conhecedor de todos os dinossauros que já habitaram a Terra. Sniper preciso de nerfs que derrubam bibelôs. Construtor de torres no Minecraft. Incapaz, porém, de chutar uma bola.

Cá entre nós: como julgá-lo? O avô só via jogos da seleção. O pai prefere partidas com Federer e Nadal. Eu mesma só lembro que jogador existe quando algum aparece nos portais, preso em cassino clandestino.

Ilustração de um criança vestindo uniforme de futebol e chapéu de aniversário. Um cartão vermelho está sendo mostrado para a criança, enquanto um brigadeiro está quicando na imagem. Há um pequeno texto do lado direito "Convite: Niver do Neymessi Ronaldo / Local: Play / Traje obrigatório: Camisa oficial do seu time europeu* na temporada 20-21 / *Times brasileiros serão barrados na porta". No fundo, há a ilustração de um gol, várias bandeiras e jogadores de futebol enfileirados.
Marcelo Martinez/Folhapress

Ainda assim, entre homens e meninos reina esse pressuposto de que é preciso gostar do esporte. Afinal, o noticiário é massivo na rádio, na 
TV e na internet. “O Brasil é o país do futebol.” E também 
do frescobol, ué. Por que não mesas redondas sobre isso? “Porque frescobol não movimenta a economia.” Tem certeza? Pergunta aos vendedores de cerveja na praia. Enfim.

Até tentei colaborar. Vai que a dificuldade era escolher um time. “Tudo bem torcer pelo Corinthians e pelo Espigão de Rondônia.” Pensei inclusive em incentivá-lo a imitar o esquema tático dos vizinhos, que é berrar da janela “(inserir time), p****!”. Sem o palavrão, claro. Mas não funcionou. Aqui a gente só grita “fora, Bolsonaro” mesmo.

Nem o futebolzinho recreativo se salvou. Aquela pelada de quinta entre amigos, seguida de churrasco. Ou, na versão infantil, o bate-bola no recreio.

“Por que você tá assim?”

“Hoje me obrigaram a ser o Neymar, mãe.”

“Não tinha outra opção?”

“Tinha: Ronaldinho Gaúcho.”

“Me dá um abraço, filho.”

Agora, se existe um 7 a 1 do sofrimento mirim, é convite para aniversário temático. 
“Venha para a festa do Pedrinho com a camisa do seu time do coração.” Olhei para a cara tristonha do meu guri: ele não tinha coração para aquilo.

Peguei, então, uma camisa preta. “Pronto, você vai de juiz. Juiz manda em todo mundo!” Olhinhos brilharam. “Esse pedaço de papel aqui é seu cartão vermelho. Expulsa quem implicar contigo. E se alguém reclamar —‘mãe de juiz’, aquela coisa— diz que eu me entendo com a Fifa.” E lá foi ele, cheio de si. Confiante feito um campeão. Placar final: mãe 1 x treta 0.

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