Bia Braune

Jornalista e roteirista, é autora do livro "Almanaque da TV". Escreve para a Rede Globo.

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Rainha Elizabeth era 'meu repolhinho' na intimidade com o príncipe Philip

Sempre acreditei que amar é se mostrar patético diante do outro, e o apelido é o vocativo da bobeirite apaixonada

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"Acabou." Como? Por quê? "Acabou." Sempre que uma relação chega ao fim, é preenchida a certidão de óbito. E, no campo destinado à causa mortis, todas as explicações de praxe. Tédio, traição, desavenças. Não se leva em conta, porém, um dos dados mais importantes. Apelidinhos: tinham?

Sempre acreditei que amar é se mostrar deliberadamente patético diante do outro, sendo o apelido uma espécie de vocativo da bobeirite apaixonada. Nomear alguém, de forma terna e vexatória, seria a base dessa íntima gramática a dois.

Claro, há os que não se entregam à falta de bom senso, optando por termos usuais como apenas "amor". Pairam acima de nós, os bocós que caçam esdrúxulas palavras. Mas tudo bem. Como já disse Fernando Pessoa, "todas as cartas de amor são ridículas e os apelidinhos de casal, também".

Mentira, o grande poeta português jamais escreveu isso. No entanto, praticou muito. Em sua famosa correspondência com Ophélia​ Queiroz, vulgo "Bebé", "Nininho" assinava as declarações mais tatibitate. "Então o meu Bebé, que disse que ia escrever ontem, não me escreveu? O Bebé não gosta do Nininho?" Ou: "Amanhã o Bebé espera pelo Nininho, sim? Jinhos, jinhos e mais jinhos".

Assistindo à série "The Crown", descobrimos que o affair proibido entre Charles e Camilla era pontuado por nominhos secretos, "Fred" e "Gladys". E que o real título da rainha Elizabeth, quando na intimidade com o príncipe Philip, era "meu repolhinho".

Na ilustração de Marcelo Martinez em colagem digital, a rainha Elisabeth – em seu tradicional estilo de vestimenta combinando chapéu e vestido –  acena para o público, mas sua cabeça é um repolho. De canto de olho, ela sussurra, com cumplicidade, para alguém fora do quadro: "Não me olha assim, Phi! Seu doido!"
Marcelo Martinez

Tal lógica hortifrutigranjeira, infelizmente, não se aplicou a uma dupla de conhecidos. Ele, "moranguinho". Ela, "maçãzinha". Um mês depois de casados, a separação e uma justificativa de incompatibilidade que poderia constar numa tabela da Ceagesp. "Não estávamos na mesma época."

Os mais formais se tratam pelo sobrenome, sobretudo quando há um militar de tocaia nesse amor. "Gonçalves, sentido! Vem dormir de conchinha." Com o advento dos filhos, os mais freudianos viram "pai" e "mãe".

Recentemente, um amigo muito supersticioso inovou. Há anos namorando Lucianas, Luanas e Lúcias, apaixonou-se perdidamente por uma Mayara e forçou a barra com o mesmo apelido. Mas o que soaria cafajestagem para a maioria, para ele foi ato de desespero cósmico. Numerológico. "Tive tanto medo de perdê-la que agora ela é Lu, diminutivo de Luz da Minha Vida".

Julguei que afeto não dispensava alcunhas até observar as duas pessoas mais felizes do meu convívio. Não tinham apelidos, nem sequer se chamavam pelo nome. Viviam uma terminologia silenciosa, de travesseiro com travesseiro e pés que se roçavam no sofá. Perguntei como era na prática. "Sei lá, a gente chega perto e fala." Daí disseram, mesmo sem precisar. "E o bom é estar sempre muito perto."

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