Bia Braune

Jornalista e roteirista, é autora do livro "Almanaque da TV". Escreve para a Rede Globo.

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Bia Braune
Descrição de chapéu Todas desigualdade de gênero

Tudo isso eu sei

Mas para além do 8 de março, quando saberemos o que realmente importa?

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Soltar pipa. Assobiar com os dedos para chamar táxi. Fazer churrasco com a galera. Desafiar as leis da física e da baliza, estacionando na vaga mais apertada. Trocar fusível. Instalar chuveiro. Matar baratas de qualquer tamanho, imbuída não de uma bravura indômita, mas da neutralidade impassível típica de quem lida com um fato que pode acontecer a qualquer momento, basta que seja verão. Trocar pneu na chuva. Beijar alguém na chuva. Explicar que um gol não valeu porque o jogador estava impedido. Arrotar bebendo coca-cola. Reparar numa bela anatomia quando calha de alguma passar. Cometer trocadilhos infames. Rir de infâmias trocadilhescas. Mandar "oi, sumido" para o primeiro na lista de contatinhos. Descalçar sapato apertado grunhindo um "uuuhhhhh" de alívio, enquanto outra pessoa está fazendo o jantar. Cheirar cabeça de filho já adormecido na cama, de banho tomado. Ensinar criança a andar de bicicleta. Responder a essa mesma criança para que mais serve o pipiu. Ser de humanas e estar na cabeceira de uma reunião com matemáticos e engenheiros. Ver filme sanguinolento com zumbis devoradores de cérebro só para relaxar a cabeça depois do trabalho. Chamar mestre de obras turrão na xinxa, quando falta nível no trato e na instalação de uma pia. Falar palavrões cabeludos porque sim. Fazer merda. Engolir doses de álcool forte e desaforo leve numa só talagada. Dar vraus dizendo "...e tenho como provar!", puxando uma planilha ou argumento impecáveis. Querer mais do mundo. Acordar todas as manhãs me achando no direito.

Tudo isso eu sei.

O que falta agora —para mim e todas nós— é saber quando tudo isso poderá ser visto, de uma vez por todas, como coisa de mulher. Também. Qualquer mulher. No 8 de março ou em outra data à nossa escolha, sem ressalvas de calendário. Uma liberdade universal e atemporal de fazer, ser e querer qualquer coisa. Sobretudo o que ainda nem sei, mas saberemos. E poderemos.


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