Cecilia Machado

Economista-chefe do Banco BoCom BBM, é doutora em economia pela Universidade Columbia

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As incertezas de 2024

Crise climática e turbulências no cenário internacional trazem desafios em economia

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As projeções para o cenário global indicam crescimento econômico, ainda que a taxas mais baixas, e continuidade do processo desinflacionário nas principais economias desenvolvidas e emergentes. Um cenário favorável que também se repete no Brasil. Pelas projeções, passaremos de um crescimento de 3% em 2023 para algo em torno de 1,5% em 2024. Nada mal, considerando que estaremos ainda bem próximos de um crescimento que muitos analistas acreditam ser o nosso potencial, em 2%. Podemos ser surpreendidos?

O fato é que na história recente diversos outros eventos vêm sendo capazes de mudar os rumos esperados para a economia de forma brusca e expressiva. Em 2020, as políticas de isolamento social decorrentes do Covid-19 trouxeram forte contração econômica com mudanças nos padrões de consumo —mais direcionados para bens— e de produção —com gargalos nas cadeias produtivas— que também influenciaram a dinâmica inflacionária.

Fachada do Ministério da Fazenda com o letreiro trocado. Pessoa passa à frente do prédio. Uma árvore faz sombra sobre o letreiro.
Fachada do Ministério da Fazenda com o letreiro trocado - Gabriela Biló/Folhapress

É evidente que a pandemia corresponde a um evento extremo com implicações que são muito difíceis de serem antecipadas, mas, mesmo após ela, a dinâmica da economia continuou trazendo surpresas para muitos analistas. Isso porque, tradicionalmente, processos desinflacionários são acompanhados por uma contração da economia mais forte. Mas desta vez, a convergência da inflação a patamares mais baixos está vindo com poucos custos para a atividade, que segue resiliente, a exemplo do que vemos no mercado de trabalho, com taxas de desemprego em patamares historicamente baixos.

Isso seria um indicativo de que os modelos e mecanismos associados aos canais tradicionais de demanda passaram a se tornar menos relevantes para explicar a evolução da economia? De fato, diversos outros fatores relacionados à oferta estão por trás da dinâmica desinflacionária recente, a exemplo do enorme choque no preço de bens comercializáveis que se seguiu da normalização das cadeias produtivas. E este ano há razões para esperar que outros choques idiossincráticos continuem surpreendendo as previsões econômicas.

Em 2024, os olhos dos economistas também estarão nas anomalias climáticas —que no Brasil é um importante determinante para a produção do setor agropecuário— e em condições globais que ampliam os riscos de conflito geopolítico, a exemplo de eleições presidenciais nos Estados Unidos.

A confirmação de um El Niño mais forte, e seus efeitos sobre a temperatura e precipitação ao longo do território, pode provocar queda e atraso na produção agrícola, com reflexos também no preço destes produtos. No Brasil, seus impactos já se fazem sentir na inflação de alimentos frescos e é possível que esta anomalia altere a produtividade do setor. O agronegócio —que de forma mais ampla também engloba a produção de máquinas e equipamentos e serviços direcionados ao setor primário— movimenta cerca de 30% da nossa economia. Vale lembrar que em 2023 o agro surpreendeu para cima e desencadeou uma série de revisões de crescimento por conta dos efeitos de transbordamento do setor primário para os demais segmentos da economia. Se em 2024 a anomalia climática trouxer surpresas para baixo, as revisões de crescimento devem se dar de forma simétrica.

2024 também será um importante ano eleitoral, com a definição de presidentes para cerca de 50% da população do planeta. Em Taiwan, a população escolheu um candidato pró-independência, mas que vem mostrando moderação de discurso desde sua eleição. Em novembro, as eleições dos Estados Unidos podem devolver a Donald Trump a cadeira de presidente, e sua visão sobre comércio, imigração e setores estratégicos da economia devem ditar novos rumos para a maior economia do mundo, incluindo ampliação da disputa geopolítica com seu maior rival, a China.

Quando clima e geopolítica integram os cenários de riscos para as projeções econômicas, as incertezas se ampliam, e os resultados podem ser muitos. Navegar 2024 exigirá bastante cautela.

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