Cecilia Machado

Economista-chefe do Banco BoCom BBM, é doutora em economia pela Universidade Columbia

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A influência de Claudia Goldin

Nobel de Economia para a norte-americana é uma vitória dupla

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O prêmio Nobel de Economia deste ano reconheceu a importância dos estudos de Claudia Goldin para explicar a evolução histórica da participação das mulheres no mercado de trabalho. Enquanto apenas uma em cada três mulheres ingressou na força de trabalho após a Segunda Guerra Mundial, hoje mais de duas em cada três o fazem.

Goldin produziu, ao longo de sua carreira, inúmeros artigos combinando dados inovadores e boa metodologia empírica para analisar as diferenças entre os gêneros no mercado de trabalho. Seus trabalhos são capazes de explicar a enorme transformação que observamos na trajetória de emprego e carreira das mulheres de diferentes gerações, e os reais motivos pelos quais ainda não atingimos equivalência plena de salários entre homens e mulheres nos dias de hoje.

Claudia Goldin concede entrevista após ser premiada com o Nobel de Economia de 2023
Claudia Goldin concede entrevista após ser premiada com o Nobel de Economia de 2023 - Carlin Stiehl/Getty Images/AFP

A economista abriu caminho para derrubar vários mitos relacionados à baixa representatividade de mulheres em posições que pagam maiores salários, como explicações que atribuem peso às diferentes escolhas educacionais e ocupacionais que as pessoas fazem ao longo da vida. Em seus trabalhos, ela mostra que houve convergência nos investimentos educacionais e escolhas ocupacionais entre os gêneros, mas que esta é apenas uma parte da história.

A pílula anticoncepcional, e seu uso entre as jovens na década de 70, por exemplo, é um fator importante por trás da convergência de escolhas. Ao reduzir os custos de investimento em educação profissional —aquelas que exigem dedicação por maior tempo, como nas carreiras de médicos e advogados— a pílula permitiu que as mulheres pudessem ter uma vida sexual ativa sem o risco da gravidez.

Foi através desta tecnologia que casamento e maternidade se dissociaram do sexo. O "poder da pílula" se traduziu no aumento de mulheres seguindo em carreira profissionais e no aumento da idade em que se casam, delegando às mulheres a decisão de quando se casam, quando querem ter filhos e quais carreiras querem seguir.

Hoje as mulheres já superam os homens em escolaridade, e apesar de escolherem ocupações semelhantes às dos homens, ainda vemos que a diferença de salário persiste mesmo quando comparamos homens e mulheres na mesma ocupação.

A maternidade novamente aparece entre as explicações. Diferenças em interrupções de carreira e nas horas trabalhadas —que estão largamente associadas à maternidade— compõem os motivos para a divergência entre homens e mulheres que fizeram os mesmos investimentos educacionais e as mesmas escolhas de carreira.

Em um estudo que acompanha a trajetória profissional de alunos de MBA nos Estados Unidos, Goldin mostra que os homens ganham mais que as mulheres da mesma turma após dez anos da formatura, apesar de o diferencial ser próximo de zero assim que terminam o MBA. É por isso que, nas palavras de Goldin, não é possível ter igualdade no mercado de trabalho enquanto não houver igualdade entre os casais.

Entender o passado é importante para delinear o futuro, e os estudos mais recentes de Goldin estão sendo capazes de apontar caminhos para um ambiente de maior igualdade entre os gêneros no mercado de trabalho, em soluções que não necessariamente envolvem o poder público dizendo o quanto se pode ou não pagar para homens e mulheres exercendo a mesma função.

Goldin mostrou que é difícil inferir comportamento discriminatório por parte das empresas, e que, apesar de a discriminação existir, a desigualdade entre os gêneros é um fenômeno muito mais complexo que também responde às normas sociais e ao funcionamento do mercado de trabalho.

Sabe-se, por exemplo, que trabalhos mais flexíveis ou em tempo parcial remuneram desproporcionalmente menos por hora do que em um contrato de trabalho onde muitas horas são oferecidas, ou quando o trabalhador está sempre disponível para as tarefas que são menos previsíveis. Como as mulheres demandam mais flexibilidade em suas jornadas, Goldin mostra que avanços tecnológicos que aumentam a substituição entre trabalhadores diminuem a penalidade do trabalho em tempo parcial e contribuem para a redução das diferenças salariais entre os gêneros.

Goldin foi a terceira mulher a ganhar o prêmio Nobel, sendo a primeira a ganhá-lo sozinha, além de ter sido a primeira mulher promovida a cargo de professora titular no departamento de economia da Universidade Harvard. O reconhecimento da importância do trabalho de Goldin ganha ainda mais relevância quando se constata que na profissão de Goldin, mulheres correspondem a apenas 33% das posições de professores assistentes, 27% em posições de professor associado, e 18% em posição de professor pleno.

O Nobel para Claudia Goldin é uma vitória dupla: ela não apenas produziu pesquisa de relevância acadêmica sólida para prêmio, como foi capaz de se tornar símbolo de excelência em um campo ainda majoritariamente dominado por homens.

O livro "Carreira e Família" é uma ótima leitura para aqueles que quiserem conhecer um pouco mais sobre o trabalho de Claudia Goldin.

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