Celso Rocha de Barros

Servidor federal, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra) e autor de "PT, uma História".

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Celso Rocha de Barros
Descrição de chapéu guerra israel-hamas

Solução de dois Estados é difícil, mas o resto não é solução na guerra Israel-Hamas

Torço para que Autoridade Palestina recupere o controle de Gaza, e para que o espírito de Ytzak Rabin ainda inspire alguém em Israel

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São Paulo

O Kibbutz Be’Eri, atacado pelo Hamas na última semana de maneira brutal e covarde, foi fundado por jovens socialistas. Eram membros do movimento HaNoar HaOved VeHaLomed, a "Juventude Estudantil e Trabalhadora". No site do movimento, consta a informação de que a organização é "irmã" do Habonin Dror, fundado a partir da fusão de dois movimentos. Um deles, o Dror, de orientação socialista, teve entre seus membros brasileiros Paul Singer, um dos principais intelectuais da história do PT.

Se o leitor ficou surpreso com a associação entre Israel e a esquerda, ainda não viu nada. A guerra de independência de Israel foi ganha com armas da Tchecoslováquia comunista, e a União Soviética foi o primeiro país do mundo a reconhecer Israel. E não foi o Gorbatchov: foi o Stálin.

Existe gente mais qualificada que eu para explicar as reviravoltas geopolíticas subsequentes, mas, no final do processo, todo mundo tinha mudado de lado. A direita, que tinha uma longa história de antissemitismo, passou a defender Israel e fingir que tinha passado os anos 30 em coma.

Homem palestino carrega menina ferida ao sul da faixa de Gaza, em meio ao conflito Israel-Hamas - Yasser Qudih/Reuters

Com o tempo, Israel foi se tornando uma democracia moderna, que proporcionou a seus cidadãos um Estado de bem-estar social importante e amplas liberdades individuais (Inclusive reconhece o casamento LGBT firmado no exterior —não existe casamento civil no país). E, ao mesmo tempo, submeteu os palestinos a uma situação colonial brutal.

Para complicar as coisas, Israel não é um colonizador típico. É um país formado a partir da diáspora de um povo que recém escapara do risco de extinção. Os europeus deram aos judeus todo direito do mundo de acreditar que, sem um Exército próprio, sua existência pode voltar a ser ameaçada.

Por isso, a maior parte da esquerda internacional defende a solução de dois Estados. É a posição do PT. Ela está presente, por exemplo, no "Documento Básico" do núcleo de militantes judeus do partido, a Caju (Comissão de Assuntos Judaicos), apresentado em São Paulo em maio de 1987 ("Iyar de 5747").

Nos anos 90, os acordos de Oslo, celebrados entre o governo trabalhista de Ytzak Rabin e a OLP de Yasser Arafat, deram a impressão de que o conflito no Oriente Médio poderia começar a ser resolvido.

Em Oslo, encontraram-se o principal representante da esquerda israelense e o movimento palestino mais próximo da esquerda mundial, inclusive do PT. Trabalhistas israelenses e Fatah palestina (o grupo mais forte dentro da OLP) chegaram a conviver na Internacional Socialista por um breve período na década passada. Os israelenses saíram quando a IS aderiu ao boicote contra Israel.

Mas os radicais anti-Oslo venceram. O Hamas conseguiu tomar Gaza da Autoridade Palestina, controlada pelo Fatah. Yigal Amir, um militante de extrema direita israelense, matou Ytzhak Rabin. Um mês antes do assassinato, um jovem extremista, Itamar Ben-Gvir, apareceu na TV segurando um adereço do carro de Rabin e dizendo "já chegamos ao seu carro, chegaremos em você". Hoje ele é ministro no governo Netanyahu.

Não sabemos se a nova ocupação de Gaza degringolará em matança indiscriminada, ou se o conflito se regionalizará. Se conseguirmos evitar esses dois riscos, torço para que a Autoridade Palestina recupere o controle de Gaza, e para que o espírito de Rabin ainda inspire alguém em Israel. A solução de dois Estados é difícil, mas o resto não é solução.

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