Celso Rocha de Barros

Servidor federal, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra) e autor de "PT, uma História".

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Celso Rocha de Barros

Cid entregou Bolsonaro

Ex-presidente propôs o golpe sabendo que estava propondo uma guerra civil

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Se há um sujeito burro o suficiente para morrer na cadeia por Bolsonaro, ele não deve ter sido primeiro colocado em sua turma no Exército.

Por esse motivo, o tenente-coronel Mauro Cid resolveu entregar Jair para a polícia: não quis ser mártir em uma religião cujo messias já planejava se aposentar com mesada do Valdemar Costa Neto e um pé de meia construído com muamba.

O ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), tenente-coronel Mauro Cid, e o ex-presidente - 8.set.23/Reuters

Segundo trechos da delação de Cid já obtidos pela imprensa, o então presidente Jair Bolsonaro convocou uma reunião com os chefes das Forças Armadas após ter sido derrotado na eleição presidencial de 2022.

Trazia uma minuta de declaração de golpe que lhe teria sido entregue pelo assessor Filipe Martins. Martins é um seguidor de Olavo de Carvalho, guru do Bolsonarismo que faleceu, com imperdoável atraso, em 2022.

Segundo Cid, os chefes do Exército e da Aeronáutica não aceitaram a proposta de Jair. Só o comandante da Marinha, Almir Garnier dos Santos, teria colocado suas tropas à disposição para o golpe.

O relato de Cid confirma reportagem de Ana Clara Costa, publicada na revista "piauí" de junho de 2023, que contou como o almirante, "plantonista do golpe", havia sido o único chefe das Forças a topar a aventura golpista proposta por Bolsonaro em 2022.

Se Cid estiver falando a verdade, o almirante Garnier é um desertor que deve receber o tratamento reservado aos desertores pelos códigos militares e pela tradição marcial. Bem disse Ulysses Guimarães: traidor da Constituição é traidor da pátria.

Se Cid estiver falando a verdade, Garnier é, antes de tudo, um ladrão: pretendia roubar as armas da Marinha, que havia jurado honrar, para impor aos brasileiros a ditadura de bandidos a quem os eleitores haviam acabado de negar a reeleição.

Se Garnier tentasse a mesma gracinha, digamos, nos Estados Unidos, amanheceria no dia seguinte lavando as cuecas do chefe da Al Qaeda em Guantánamo.

Mas se esse é o julgamento de Garnier, o que dizer de Bolsonaro, autor do convite que Garnier teria aceitado?

Na reunião descrita por Cid, este indivíduo, Jair Messias Bolsonaro, ocupando o topo do Poder Executivo, propôs abertamente, a homens que comandavam todos os militares brasileiros, que destruíssem a democracia brasileira para lhe garantir a boquinha.

Propôs isso logo após a maioria do eleitorado ter deixado claro que não o apoiava. Propôs o golpe, portanto, sabendo que também estava propondo uma guerra civil.

Quando, nas semanas seguintes, os golpistas acamparam em frente aos quartéis e, no 8 de janeiro, destruíram as sedes dos Poderes da República, certamente sabiam o que Jair estava propondo e que havia gente como Garnier aceitando.

Os acampamentos não foram desmontados antes, afinal, porque estavam cheios de familiares de militares.

Os golpistas de 8 de janeiro só repetiram, em praça pública, a oferta que Bolsonaro fez aos militares em reunião fechada: roubem as armas da República, destruam a democracia, nos arrumem uma boquinha.

Depois do que Cid nos contou, é mais fácil entender a coragem dos golpistas de 8 de janeiro. Enquanto quebravam os prédios, olhavam para cima, na esperança de que um levante popular levasse mais Garniers a se juntarem a Bolsonaro. Jair organizou o golpe por cima e inspirou-o por baixo.

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