Cida Bento

Conselheira do CEERT (Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades), é doutora em psicologia pela USP

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Cida Bento

Equidade racial se destaca no debate de ESG

Quem se beneficia do sistema desigual cria obstáculos às mudanças

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Uma mirada no noticiário sobre o mundo corporativo nos últimos meses coloca em evidência o crescente debate sobre os valores envolvidos na sigla ESG (em português, Ambiental, Social e Governança), um conjunto de critérios de responsabilidade social corporativa que envolve desde a preservação do meio ambiente até o combate aos efeitos do racismo, sexismo, machismo e discriminação contra LGBTQI+ e pessoas com deficiência.

Pode ser uma resposta à crescente pressão social sobre como devem se comportar as empresas no contexto de políticas de governança responsáveis, éticas e de respeito à pluralidade que marca a sociedade em que estão inseridas.

Merece destaque nesse processo a busca de equidade racial no mundo de trabalho, pois como dizia Florestan Fernandes, “o trabalho lança raízes no Brasil através do trabalho escravo”, ou seja, a população negra no Brasil, durante quase 4 dos nossos 5 séculos, foi a principal, senão a única, população trabalhadora. Alterar a atual condição de exclusão e sub-representação desta população no mundo do trabalho, especialmente em posições de liderança, é um desafio a ser enfrentado.

A luta por condições de trabalho digno marca toda a história desta população no país, incluindo o período da escravidão.

Num período mais recente, a partir de 1990, ações estratégicas e direcionadas do Movimento Negro impulsionaram políticas públicas, envolvendo o Ministério do Trabalho e as delegacias regionais do Trabalho, a partir da denúncia que fizemos do descumprimento pelo Brasil, da Convenção 111 da Organização Internacional do Trabalho que trata de equidade na ocupação e emprego.

Neste período, o movimento sindical pressionado pelo movimento negro, criou instâncias de combate ao racismo, nas centrais sindicais e nos sindicatos, permitindo que categorias profissionais –como bancários, químicos e comerciários— aprovassem em acordos coletivos o desenvolvimento de políticas e práticas antirracistas.

Entre as conquistas do movimento negro, merecem destaque os programas de ações afirmativas nas principais universidades do país, que possibilitaram a centenas de milhares de jovens negras e negros a experiência universitária e a busca de inserção qualificada no mundo do trabalho, abalando o argumento de que “não há negros com a escolaridade exigida”.

Na última década tem se intensificado muito o trabalho em busca da equidade por dentro de organizações públicas e privadas e da sociedade civil, que se traduzem na criação de instâncias internas às instituições (comitês de diversidade/equidade) que promovem ações concretas, como diagnósticos das desigualdades de cargos, salários, oportunidades de treinamento, de promoção de mentorias e desenham planos de ações, com metas e métricas a serem monitoradas.

Neste contexto, é recorrente o debate sobre o fato de que se o sistema fosse meritocrático não teríamos na liderança das organizações brasileiras sempre um mesmo perfil, masculino e branco. Ou seja, os códigos institucionais para se ocupar posições de vanguarda, científicas e de comando nas organizações são aprendidos, consolidados e transmitidos para as novas gerações ao longo da história do país. Assim como são transmitidas as heranças históricas que se traduzem concretamente nas desiguais condições de vida dos segmentos populacionais.

Portanto, é preciso não subestimar as resistências à promoção da equidade, pois muitas vezes quem se beneficia do sistema desigual cria grandes obstáculos às mudanças.

E este processo não pode ser descolado de outras transformações que assegurem e fortaleçam a voz da classe trabalhadora, como a atuação do movimento sindical e dos órgãos de pesquisa que evidenciam sua situação, para orientar políticas públicas e iniciativas das próprias empresas e outras instituições empregadoras.

No caminho de tornar os ambientes de trabalho mais equitativos, mudanças estruturais que envolvem a cultura organizacional são fundamentais para tornar efetivas as políticas e práticas ESG.

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