Cida Bento

Conselheira do CEERT (Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades), é doutora em psicologia pela USP

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Cida Bento

Grupos em permanente busca por direitos estão mais vulneráveis ao adoecimento mental

Autocuidado nos estimula a recuperar memórias sobre nossas potências coletivas

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Neste Setembro Amarelo, mês em que concentramos nossa atenção na prevenção ao
suicídio
—que atinge, no Brasil, 13 mil pessoas a cada ano—, mais do que nunca temos que atentar para as condições que tornam a vida de tantas pessoas insuportável de ser vivida. ​

De acordo com estimativas da OMS (Organização Mundial da Saúde) de 2021, o suicídio continua sendo uma das principais causas de morte no mundo. A campanha Setembro Amarelo envolve várias organizações, como a ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria) e o CFM (Conselho Federal de Medicina). O CVV (Centro de Valorização da Vida) é um apoio permanente ao enfrentamento desse desafio no campo da saúde.

Muitos problemas no campo da saúde mental da população brasileira foram acirrados pela crise sanitária e econômica, que incide sobre o aumento dos índices de suicídio, como diversos estudos que ganharam manchete na grande mídia nos mostraram nestes tempos de pandemia.

Adesivos da campanha Jornada do Acolhimento na estação Paulista, na linha 4-amarela
Adesivos da campanha Jornada do Acolhimento na estação Paulista, na linha 4-amarela - Divulgação

No Brasil, milhões de pessoas se encontram desempregadas, e os problemas de segurança alimentar, de acesso à saúde, à moradia, ao trabalho digno geram sofrimento principalmente em períodos como o que estamos vivendo, em que o governo reduz orçamentos para políticas públicas.

Do lado oposto, o fortalecimento de políticas de proteção social funcionou como elemento de prevenção ao aumento de doenças mentais na Itália, no período de 2000 a 2010, segundo publicação do Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz.

Nesse sentido, estabelecer diálogo social é imprescindível para encontrar saídas que envolvam governos, empregadores, trabalhadores e movimentos sociais, para enfrentar conjuntamente a crise.

Conflitos de classe, de raça, violência de gênero e outros estão relacionados com o sofrimento psíquico, individual e coletivo. Grupos que vivem uma permanente busca pelos seus direitos e para afirmação social da sua identidade estão mais vulneráveis ao adoecimento mental.

Na população indígena, o suicídio foi quase três vezes maior que a média nacional, segundo o Ministério da Saúde, em 2018. Acrescente-se a isso o fato de que 79% dos suicídios ocorrem em países de baixa e média renda, segundo a Opas (Organização Pan-Americana de Saúde), em 2016.

Audre Lorde, mulher negra, apontou caminhos essenciais para acolher e enfrentar esse desafio de crise, cunhando o termo “autocuidado”, debatido em grupos feministas e antirracistas e conectado com o contexto político e coletivo.

Audre fala em transformação pessoal e política ao mesmo tempo. Trata autocuidado como a construção de nosso bem-estar, de nossa sobrevivência.

Em um coletivo acolhedor, o autocuidado permite reconhecer-se com medo, impotente, frágil e buscar a autopreservação diante de um ambiente ameaçador. Ou seja, um coletivo com uma escuta ativa para os sentimentos de dor, de perdas, de humilhação e sujeição.

Ao cuidar dos outros e se deixar cuidar, alimentam-se a reciprocidade, a cumplicidade e a solidariedade, resgatando e fortalecendo a autoconfiança e a fé no coletivo.

O autocuidado vem sendo exercitado por coletivos de mulheres negras, indígenas e quilombolas. São grupos que nos provocam a pensar em uma humanidade que preserva tanto a vida humana como a de outros seres vivos no planeta. Ou seja, do próprio planeta.

Nessa atividade política coletiva, criam-se redes de solidariedade para garantir alimentação e produtos de higiene para periferias urbanas desempregadas, reduzindo os danos da política genocida, pois o autocuidado está no território do bem viver, do afeto e da amorosidade.

Nos estimula a recuperar as memórias sobre nossas heranças, nossas riquezas esquecidas, nossas potências coletivas que permitem criar outras realidades políticas e sociais e reforçar o nosso compromisso e bem-estar com a vida.

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