Cida Bento

Conselheira do CEERT (Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades), é doutora em psicologia pela USP

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Cida Bento
Descrição de chapéu Independência, 200

O Brasil que queremos - Parte 2

Vale a pena refletir sobre os projetos políticos antagônicos para determinar o rumo do país

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Neste período em que se completam dois séculos da afirmação de independência deste país e em que também se avizinha uma eleição que vai definir seu rumo, vale a pena refletir sobre os projetos políticos absolutamente antagônicos que ora se apresentam.

Um ponto de partida podem ser questões apontadas pelo professor Hélio Santos em artigo incluído no recém-lançado livro A Resistência Negra ao Projeto de Exclusão Racial: Brasil 200 anos (1822-2022), coletânea de 34 artigos de intelectuais negras e negros por ele mesmo organizada, da qual também participo, publicada pela editora Jandaíra.

Imagens de Cosme e Damião que, pela Igreja Católica são os padroeiros dos farmacêuticos, dos médicos e das faculdades de medicina, e na Umbanda e no Candomblé são considerados os protetores das crianças - Rubens Cavallari -24.set.21/Folhapress

No texto síntese da coletânea, o professor ressalta a necessidade de que a celebração do bicentenário da independência seja acompanhada de uma honesta autocrítica das injustiças acumuladas contra a maioria da população brasileira e a cura necessária das graves sequelas sociais causadas por uma abolição da escravatura que deu lugar a uma república na qual um dos projetos era o extermínio —sim, isso mesmo– da população negra e sua substituição por imigrantes europeus.

Com clareza cristalina, Hélio nos mostra como as principais legislações implementadas pelos governantes desse período de transição tiveram como objetivos explícitos reprimir e isolar a população negra recém-liberta, ao mesmo tempo em que garantia boas condições de transporte, recepção e permanência aos imigrantes europeus que iriam ocupar os melhores (e, frequentemente, também os piores) postos do mercado de trabalho. O tempo passou –mais de um século– mas as linhas gerais desse projeto excludente se mantêm e é de sua continuidade ou substituição que falamos aqui.

Numa entrevista recente ao podcast @podpax, o pastor e teólogo Ed Renê trouxe uma perspectiva sobre o drama que vivemos focalizando o respeito aos marcos civilizatórios.

Renê pergunta ao entrevistador o que aconteceria se um homem negro disparasse acidentalmente uma arma de fogo em um aeroporto, como aconteceu com um ministro do atual governo, sem nenhuma consequência. Pergunta o que aconteceria se ficasse provado que o presidente Lula comprou 51 imóveis em dinheiro vivo.

Ele pergunta como pode o ex-ministro que fez passar uma boiada no sentido de desmantelamento dos órgãos de controle e proteção de nossas florestas recebeu mais votos do que Marina Silva, reconhecida por defender a proteção e cuidados com o meio ambiente.

Que Brasil é esse?

De fato, estamos falando em modelo de civilização. Quando num país laico o estado busca impor a perspectiva de uma única religião e fiéis desta religião se julgam autorizados para depredar, destruir, incendiar terreiros, de religiões de matriz africana, estamos falando de modelo de sociedade que pode ser apoiado ou não.

Por outro lado, estamos falando em marcos civilizatórios trazidos frequentemente por organizações de mulheres negras, como pedra de toque para as transformações que temos que fazer no Brasil, rumo ao bem-viver.

Falamos de um Brasil que resgate posturas ético-políticas que atendam a população e de um país que possa respeitar a maneira de ser, ver e viver no mundo dos diferentes grupos e povos, seus saberes e fazeres, a forma como resistem a um tipo de dominação capitalista ocidental colonial/moderna, pois é da pluralidade que surge o alargamento dos horizontes de toda a sociedade.

Como destacou Desmond Tutu, na luta contra o Apharteid na África do Sul, há que se falar em UBUNTU enquanto uma democracia que construa uma ponte histórica entre o passado de uma sociedade cheia de conflitos, "sofrimento incalculável e injustiça, e um futuro que reconheça os direitos humanos, a coexistência pacífica e as oportunidades de desenvolvimento para todos". Dia 30 de outubro teremos a oportunidade de mudar os rumos de nosso país. Façamos!

Esta coluna foi escrita por Cida Bento e por Flavio Carrança, da Cojira (Comissão de Jornalistas pela Igualdade Racial)

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.