Claudia Tajes

Escritora e roteirista, tem 11 livros publicados. Autora de "Macha".

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Claudia Tajes

Se o Brasil fosse uma novela

Vai ver que tudo não passa de um programa de baixaria

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Para começar, não estaríamos divididos em classes, mas em núcleos, se o Brasil fosse uma novela. E qualquer personagem do núcleo pobre poderia ascender vendendo sacolé ou pulseirinha de miçanga. 

O prestígio, o poder e, de brinde, o amor de algum abonado do núcleo rico, viriam naturalmente. Aí bastava ficar de olho para uma irmã gêmea ou um amigo da onça não puxar o tapete, coisa que acontece muito no horário nobre. Adeus perrengues, empréstimos consignados e nome no SPC. A vida seria muito mais justa se o Brasil fosse uma novela.

Ilustraçnao de mulher sentada de pijama do Mickey, com um controle remoto na mão, debaixo das cobertas
Cynthia Bonacossa/Folhapress

Se o Brasil fosse uma novela, a gente comeria o pão que o demônio formatou à sua imagem e semelhança com a certeza de que o bem vence no final. Não confundir “bem” com “cidadão de bem”, que na novela é sempre aquele personagem que se faz de santinho para conseguir o que quer. A diferença é que, na ficção, ele acaba desmascarado. Na vida de verdade, tem grandes chances de virar político ou pastor.

Toda novela tem o seu núcleo cômico, o chamado alívio cômico, com tipos que se repetem desde os primórdios da dramaturgia: o jeca, o imprestável, o fanático, o desonesto, o aloprado, o carreirista, a recatada, o artista sem glórias, o tiozão das piadas de duplo sentido, a mulher de meia-idade com certas fixações, o filósofo perturbado, os tontos, a imitadora, a espertalhona. 

Qualquer autor iniciante sabe que não se deve juntar todos esses tipos na mesma cena para que não se perca a verossimilhança —no frigir dos ovos, a única coisa que distingue a realidade da representação.

Sendo que quem precisa ser verossímil é a representação, claro. Por isso mesmo, se o Brasil fosse uma novela, o roteirista já teria tomado uma justa causa há horas. 

Se o Brasil fosse uma novela, seria até divertido ouvir as barbaridades que são ditas nos plenários, nas tribunas, no púlpito da ONU, nas lives do Facebook. 

O fogo da Amazônia seria cenográfico, olha que incrível. E se um dos atores largasse um “I love you” sincero na cara do outro, recebendo de volta um “bom te ver” protocolar, talvez até corresse uma lágrima.

Quem nunca levou um toco da pessoa amada? 

Se o Brasil fosse uma novela, era só desligar a TV. Pior que está mais para Programa do Ratão.

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