Cláudia Collucci

Jornalista especializada em saúde, autora de “Quero ser mãe” e “Por que a gravidez não vem?”.

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Cláudia Collucci

Nos EUA, namorado vai à Justiça em nome do embrião abortado

No Brasil, cresce lobby contra os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres

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Uma adolescente de 16 anos engravida, não deseja o bebê e, com a concordância dos pais, faz um aborto com o uso de medicamentos na sexta semana de gestação. 

Com ajuda de grupos antiaborto, o namorado Ryan Magers, 19, que era contra a interrupção da gravidez, vai à Justiça para processar o centro que realizou o procedimento e a fabricante da pílula abortiva. Ele também passa a representar legalmente o embrião abortado a quem ele chama de "Baby Rose".

Parece roteiro de filme de ficção de muito mau gosto, mas o caso é real, aconteceu no condado de Madison, no Alabama (EUA), que tem uma das leis mais restritivas ao aborto nos Estados Unidos e onde bebês não nascidos são legalmente pessoas. Lá, uma mulher grávida que sofreu um acidente de trânsito chegou a ser processada por colocar a vida do bebê em risco.

Os advogados de Magers dizem se tratar do primeiro caso na história em que um tribunal permite que um homem entre com um processo em nome de um embrião abortado.

"Estou aqui pelos homens que querem seus filhos", disse Mager a um canal de TV local. Ele se refere à ex-namorada como "a mãe", que, aliás, não está sendo processada por ele.

O caso vem na esteira da aprovação de uma emenda constitucional estadual aprovada em novembro passado, que garante a "proteção dos direitos do feto" e "reconhece e apoia a santidade da vida não-nascida e os direitos da criança não-nascida", incluindo o direito à vida. 

A emenda permitiu que legisladores estaduais aprovassem o estatuto da "personalidade fetal", que determina que a vida começa na concepção. Outros estados americanos têm seguido essa linha, colocando o direito ao aborto sob ameaça.

Apesar do barulho que a decisão no Alabama está causando, especialistas dizem que as mulheres e os grupos de direitos reprodutivos não têm com o que se preocupar.

A Suprema Corte dos EUA já derrubou leis estaduais que exigiam que as mulheres obtivessem permissão de seus parceiros para abortos.

O que a gente tem a ver como isso? No Brasil, cresce o lobby de grupos antiaborto no Planalto e no Congresso. Na primeira sessão da Casa, senadores desengavetaram uma PEC que proíbe a realização de aborto. Recém-chegado à Câmara, o deputado federal Márcio Labre (PSL-RJ) propõe restringir regras de aborto legal no país.

Um das pautas prioritárias para a ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, é ver aprovado o Estatuto do Nascituro, projeto que tramita na Câmara dos Deputados e que prevê, além da garantia de direitos do feto, uma bolsa à mulher que sofreu estupro e que decidiu manter a gravidez, apelidada de “bolsa estupro”.

Logo após a indicação ao ministério, ela disse que o tema é prioritário. “Temos projetos interessantes no Congresso Nacional. O mais importante que a gente vai estar trabalhando é a questão do Estatuto do Nascituro. Vamos estabelecer políticas públicas para o bebê na barriga da mãe nesta nação”, afirmou em entrevista.

Para Lenise Garcia, presidente do Movimento Brasil Sem Aborto, a atuação da agora da ministra Damares e o fortalecimento da bancada evangélica no Congresso (que agora soma mais de 92 deputados e senadores) aumentam as chances de o projeto se tornar lei.

Foi exatamente essa causa que as aproximou há dez anos, nos corredores do Congresso. Damares, uma das fundadoras do movimento contra o aborto no país, era a ponte da militância com parlamentares da bancada evangélica.

Os sinais são claros de que Damares seguirá imprimindo uma linha conservadora no ministério, na contramão dos movimentos que defendem direitos de mulheres.

“Espero que Damares seja ministra de Estado no posto. Pastora evangélica é sua vida privada. Que fale em respeito aos direitos humanos e não em nome da sua fé. Que sua agenda seja de respeito aos direitos das mulheres e não de perseguição aos úteros”, diz a antropóloga Debora Diniz, professora da UnB.

Militante pelos direitos da mulheres e uma das autores de uma ação que pede a descriminalização do aborto, Debora recebeu ao longo dos últimos meses dezenas de ameaças de morte, foi incluída no Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos do governo federal e teve que sair do país.

Grupos ultraconservadores que se opõem aos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres têm aumentado a ofensiva também na Europa. O direito ao aborto está ameaçado em vários países como Polônia e Eslováquia. Sinais claros de que o corpo da mulher foi tomado como campo de batalha ideológico. 

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