É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.
Tragédia acaba em melancolia
A tragédia socioeconômica que engoliu a Grécia nos últimos cinco anos vive neste domingo (20) o seu terceiro ato eleitoral do ano, na triste situação de não poder escolher o programa preferido.
O programa já está dado: o novo pacote de austeridade imposto pelos credores em troca de uma ajuda de € 86 bilhões (R$ 372 bilhões).
Ainda assim, Zsolt Darvas, pesquisador do Centro Bruegel de Pesquisas, vê uma decisão importante no pleito: "Os eleitores gregos terão que decidir se darão um novo mandato ou ao Syriza ou à Nova Democracia (ND) para governar sem outro grande partido ou forçar os dois a cooperar no governo".
A tristeza dessa escolha é dada pelo fato de que a conservadora Nova Democracia liderou uma coalizão que implementou o pacote anterior de estabilidade, que levou a Grécia a um retrocesso econômico inédito (queda de 27% do PIB em cinco anos) e ao consequente desemprego recorde (chegou a 27% e, hoje, está em 25,2%).
O esquerdista Syriza substituiu a ND graças a uma campanha de crítica feroz à austeridade apenas para render-se depois a ela, sob a ameaça da União Europeia de forçar a saída da Grécia do euro. Seria, segundo Alexis Tsipras, o líder do Syriza, uma tragédia ainda maior.
Syriza e Nova Democracia lideram em todas as pesquisas, em situação de empate técnico, daí a hipótese levantada por Darvas: uma "grande coalizão" entre os dois principais partidos, aberta eventualmente às outras agremiações que também defendem a permanência no euro (os socialistas e os centristas do To Potami).
Funcionaria?
Responde Darvas: "Uma 'grande coalizão' tenderia a ser fonte de grandes tensões entre os parceiros, com um tratando de culpar o outro quando algo der errado".
Mas, a mais longo prazo, "se a economia começar a crescer em algum momento do próximo ano e se se retomar a criação de emprego, a coalizão poderia ficar mais estável, respaldada por um sentimento público positivo".
Pergunta seguinte obrigatória: é possível que a economia grega retome o crescimento em 2016?
As respostas disponíveis são ambíguas. A tabela que a revista "The Economist" publica habitualmente nas suas páginas finais indica, nesta semana, que a Grécia cresceu 3,7%, em termos anualizados, no segundo trimestre do ano, e crescerá 2,2% em 2016.
Mas a União Europeia prevê queda de 2,3% este ano e outro retrocesso (1,3%) em 2016.
Mesmo que a "Economist" esteja certa, os números serão insuficientes para corrigir o dano econômico e, principalmente, social infligido aos gregos pelos anos de austeridade.
A mais recente vítima é precisamente o Syriza, eleito em janeiro como novidade e abandeirado da antiausteridade e que depois se rendeu a ela.
Consequência: um terço de sua bancada de 149 deputados rebelou-se, saiu e criou uma dissidência, a Unidade Popular.
Tsipras "ficou sem programa, sem lema e sem bandeira", escreve para "El País" seu colunista Xavier Vidal-Folch.
Natural, pois, que a tragédia grega termine um novo ato em profunda melancolia.
Livraria da Folha
- Coleção "Cinema Policial" reúne quatro filmes de grandes diretores
- Sociólogo discute transformações do século 21 em "A Era do Imprevisto"
- Livro de escritora russa compila contos de fada assustadores; leia trecho
- Box de DVD reúne dupla de clássicos de Andrei Tarkóvski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade