Deborah Bizarria

Economista pela UFPE, estudou economia comportamental na Warwick University (Reino Unido); evangélica e coordenadora de Políticas Públicas do Livres

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Deborah Bizarria
Descrição de chapéu juros Selic

Arcabouço fiscal: intenções corretas mas desenho insuficiente

Se reformas forem mais frouxas do que espera governo, zerar déficit em 2024 será inviável

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

A implementação de um novo arcabouço fiscal visa trazer previsibilidade para os agentes econômicos sobre a gestão das contas públicas por parte do atual governo.

Caso bem-sucedida, a medida pode trazer um aumento da confiança dos investidores, consumidores e empresários na capacidade do governo de honrar seus compromissos e manter a estabilidade econômica. A efetividade desse novo arcabouço fiscal ainda é incerta, pois os detalhes ainda não foram completamente divulgados e o que já foi apresentado levanta pontos de atenção.

Um aspecto crítico do projeto é como as receitas serão consideradas. Caso receitas extraordinárias —como a venda de ativos ou a antecipação de royalties— sejam incluídas no cálculo, isso poderia gerar mais desequilíbrio nas contas públicas, como ocorreu no estado do Rio de Janeiro em 2017.

Naquela ocasião, o estado utilizou receitas temporárias para financiar gastos recorrentes, comprometendo sua capacidade de investimento e o cumprimento das metas fiscais. Como resultado, o Rio de Janeiro entrou em regime de recuperação fiscal com o apoio da União.

Simone Tebet (Planejamento) e Fernando Haddad (Fazenda) apresentam o novo arcabouço fiscal, no Ministério da Fazenda - Diogo Zacarias/Ministério da Fazenda

A inclusão de receitas extraordinárias no cálculo poderia colocar em risco a eficácia e a credibilidade do novo arcabouço fiscal. Portanto é crucial que o governo leve em conta a natureza das receitas ao implementar as novas regras.

Um outro ponto que tem sido levantado é quanto à capacidade do governo de cumprir as promessas ambiciosas de superávit já no terceiro ano de mandato.

Como lastro, Haddad relembrou os resultados fiscais positivos dos governos Lula. Entretanto, o cenário naquela época era mais favorável: o nível da dívida pública e dos impostos era mais baixo e o alto preço das commodities exportadas pelo Brasil elevou as receitas. Atingir o mesmo feito nas circunstâncias atuais e em pouco tempo será desafiador.

Além disso, o próprio ministro admitiu que para zerar o déficit como prometido seriam necessários recursos adicionais na ordem de R$ 100 bilhões a R$ 150 bilhões, o equivalente a 1% a 1,5% do PIB atual.

Ele sinalizou que esse montante seria obtido sem a criação de novos impostos, mas fazendo pagar imposto quem não paga ou paga muito pouco.

A redução de desonerações setoriais é um bom sinal, mas passa necessariamente pela reforma tributária do consumo e da renda, ou seja, depende de aprovação do Congresso. Se essas reformas forem mais frouxas do que espera o governo, zerar o déficit já em 2024 será inviável.

A falta de clareza sobre possíveis punições caso alguma regra desse arcabouço seja descumprida também merece atenção do governo.

Um dos problemas do teto de gastos era que, mesmo o governo aprovando propostas no Congresso que claramente visam romper o teto, não houve nenhuma responsabilização. E isso levou a novos descumprimentos e descredibilização da regra fiscal, aumentando juros e dificultando o trabalho do Banco Central em controlar a inflação.

Na proposta do novo arcabouço, ainda não houve detalhamento de quais serão os mecanismos de imposição para garantir a estabilidade institucional e, consequentemente, os benefícios da estabilização da dívida pública para o Brasil.

A proposta apresentada por Fernando Haddad tem o coração no lugar certo. A limitação do aumento de despesas e a estabilização da dívida pública são objetivos importantes, porém a falta de detalhes na proposta deve acender o botão de alerta na sociedade.

As dúvidas quanto à capacidade do governo de cumprir as promessas de superávit e a falta de clareza sobre possíveis punições em caso de descumprimento de normas precisam ser sanadas para que a proposta seja crível.

Assim, com a expectativa de saneamento das contas públicas, os juros finalmente começarão a cair —como o governo tanto quer e o Brasil tanto precisa.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.