Aeroporto em BH fecha com mais de 100 aviões sem ter para onde ir

Carlos Prates deixará de ser operado pela Infraero por decisão da gestão Bolsonaro mantida pelo governo Lula

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São Paulo

Perto de completar seu octogésimo aniversário, o aeroporto de Carlos Prates, em Belo Horizonte, estará definitivamente fechado a partir deste sábado (1º), quando deixará de ser operado pela Infraero. A decisão foi tomada ainda na gestão de Jair Bolsonaro (PL) e mantida pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Fundado em 1944, o Carlos Prates é considerado um aeroporto de serviço, dedicado ao funcionamento de escolas de aviação, oficinas para manutenção de aeronaves e empresas de táxi aéreo.

Cerca de 120 aviões de pequeno porte —com quatro a seis lugares para tripulantes e passageiros— ainda estão nos seus 22 hangares, segundo a Associação Voa Prates, formada por pilotos, empresários e outros profissionais que exercem atividades no aeródromo.

Diversos aviões de pequeno porte na pista de asfalto. Há faixas no chão pedindo ajuda ao governador Romeu Zema
Donos de aviões protestaram na última quarta-feira (29) com faixas que pedem ajuda ao governador Romeu Zema (novo) para evitar o fechamento do aeroporto Carlos Prates, em Belo Horizonte - Divulgação/Associação Voa Prates

Além de temer pelo fim de aproximadamente 500 empregos, o grupo diz que até mesmo o futuro das aeronaves é incerto. Não há, segundo a associação, aeroporto num raio de cem quilômetros com capacidade para abrigar tamanha quantidade de aviões.

O aeroporto da Pampulha, também na capital mineira, está com sua capacidade esgotada após ter recebido cerca de 15 aviões que estavam no Prates. "Será o colapso para a aviação mineira", afirma Estevan Velásquez, presidente da Voa Prates.

Circular emitida pela Infraero em 20 de março confirma que o prazo para a desmobilização das atividades se encerra neste sábado e comunica que "bens não retirados tem tempo hábil serão considerados abandonados, cuja posse ficará com a concedente, podendo dispor deles na forma da lei".

Na interpretação dos proprietários, há o risco de que o acesso às aeronaves seja bloqueado e que elas sejam incorporadas por uma eventual nova operadora aeroportuária ou a qualquer instituição que venha a ficar com o terreno, seja ela privada ou pública.

Desde 2011, a gestão de aeroportos vem saindo das mãos do governo e passando para a iniciativa privada. No caso específico do Carlos Prates, porém, a concessão enfrentaria resistência. Há pressão de grupos de moradores da capital mineira pelo fechamento aeródromo, considerado por alguns perigoso por se tratar de um equipamento voltado ao treinamento de aviadores em uma área urbana densamente povoada. A Voa Prates afirma que o aeroporto é estatisticamente seguro e argumenta que, em 80 anos, ocorreram seis acidentes com vítimas.

À Folha, por telefone, a assessoria do Ministério de Portos e Aeroportos explicou que está cuidando para que o impasse envolvendo as aeronaves seja resolvido e que não há intenção de impedir decolagens. O fechamento é para pousos.

Em nota, o ministério afirmou que um "instrumento jurídico que está sendo elaborado pela Secretaria Nacional de Aviação Civil para que a Prefeitura de Belo Horizonte possa organizar o encerramento das atividades, conferindo tempo para que as aeronaves hangaradas e os serviços prestados sejam transferidos para outras localidades de forma adequada".

"Ao longo do tempo, as operações aeroportuárias atuais poderão ser alocadas em outros aeroportos, como Pampulha e Confins, além dos aeroportos regionais da zona metropolitana da capital mineira, como o de Conselheiro Lafaiete (MG), que tem interesse em atender as escolas de aviação", diz a nota.

Existe, segundo o ministério, a intenção de que a Infraero dê suporte para que a prefeitura faça a gestão necessária do local até a completa desmobilização e retirada dos bens.

Considerando os valores do mercado da aviação, as aeronaves que estão no Carlos Prates não são necessariamente caras. Fabricadas pela empresa americana Cessna, em sua maioria, custam cerca de R$ 300 mil. "Não são para gente muito rica, mas para quem trabalha aqui, esses aviões são a vida", diz Velásquez.

Sobre a destino do aeroporto, o Ministério da Infraestrutura informou que o ministro Márcio França chegou a oferecer a gestão para o Governo do Estado de Minas Gerais, mas não houve interesse.

Já o governo mineiro enviou nota à reportagem afirmando que, por meio da Secretaria de Estado de Infraestrutura e Mobilidade, solicitou nesta semana ao ministro Márcio França que o processo de desmonte do Carlos Prates fosse prorrogado pelo período de seis meses, "para que fosse possível realizar e implementar um planejamento a respeito do aeródromo de maneira mais adequada, organizada e segura e com tempo hábil para reorganização de todos os envolvidos".

O pedido, segundo o governo de Minas, "levou em conta a complexidade da operação, que envolve diferentes atores atuantes no aeroporto, bem como a necessidade de um adequado planejamento para minimizar os impactos sociais, incluindo possíveis perdas de empregos e a não execução de serviços já contratados".

"Apesar dos esforços empreendidos, o Governo de Minas respeita a decisão do governo federal de manter o plano de desmobilização e se coloca à disposição da Prefeitura de Belo Horizonte e dos cidadãos para contribuir no processo de desmonte, observando as limitações legais", diz a nota da gestão do governador Romeu Zema (Novo).

Já a Prefeitura de Belo Horizonte, que segundo o ministério deverá assumir a gestão do terreno, afirmou que a "decisão de fechar o aeroporto cabe ao governo federal" e que confia "que esta decisão leve em conta toda a logística de transporte aeroviário, que é de competência da União, considerando-se, inclusive, os demais equipamentos regionais".

O município também informou que "manifestou apenas o interesse de receber a área para destinação social, caso a decisão de desativação fosse tomada".

"A Prefeitura de Belo Horizonte encaminhou esta proposta, que tem algumas diretrizes, como ampliação de áreas verdes e de lazer, instalação de equipamentos culturais, escolas e de saúde e também uma área para moradias populares, comércio e indústria não poluente", disse a nota da administração do prefeito Fuad Noman (PSD).

Em resposta a críticas de que a instalação de um grande conjunto habitacional no local colocaria em risco pedestres e motoristas na região do anel viário de Belo Horizonte, a prefeitura explicou que a área não poderá ser totalmente ocupada por moradias, pois o plano diretor da cidade tem regras que restringem o adensamento habitacional no local.

"O projeto definitivo para a área, no entanto, só será contratado após transferência definitiva do imóvel", informou.

Procurada pela reportagem, a Infraero não comentou até a publicação deste texto.

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