Deborah Bizarria

Economista pela UFPE, estudou economia comportamental na Warwick University (Reino Unido); evangélica e coordenadora de Políticas Públicas do Livres

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Descrição de chapéu tecnologia

Games não causam ataques em escolas

Não há evidências de que jogos violentos sejam causadores diretos de comportamento agressivo

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Em entrevista recente, o presidente Lula afirmou que os videogames são responsáveis pela violência entre os jovens, pois estimulariam a agressividade. Em meio à crise da sequência de ataques realizados em escolas, essa declaração revela não apenas uma ignorância sobre o tema, mas também uma visão ultrapassada da realidade. Ao invés de culpar os jogos eletrônicos, o governo deveria focar em promover o bem-estar e a segurança de crianças e jovens no ambiente escolar.

Apesar da crença popular de que videogames violentos são causadores diretos de comportamento agressivo em crianças e jovens, os dados não comprovam isso. Uma meta-análise de 28 estudos envolvendo mais de 21 mil jovens foi realizada com o objetivo de investigar se os jogos com conteúdo violento contribuem para o comportamento agressivo dos jovens a longo prazo.

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Guarda da GCM (Guarda Civil Metropolitana) faz segurança armada em escola infantil - Rubens Cavallari - 12.abr.2023/Folhapress

De acordo com Drummond e outros autores, os resultados indicaram que o efeito geral para os jovens foi estatisticamente insignificante. Ou seja, os estudos longitudinais não ofereceram suporte para o efeito de longo prazo entre o conteúdo agressivo do jogo e a agressão dos jovens. Além disso, os pesquisadores argumentam que é mais provável que as correlações sejam explicadas por problemas metodológicos e efeitos de viés dos pesquisadores do que reflitam dados do mundo real.

Outros estudos corroboram a falta de causalidade entre jogos agressivos e o comportamento de crianças e jovens. Um deles é a pesquisa conduzida pelo Andrew Przybylski e por Netta Weinstein que também investigou se os adolescentes que jogam videogames violentos têm maior propensão a apresentar comportamentos agressivos do que aqueles que não jogam. Para isso, foi realizada uma entrevista com uma amostra de adolescentes britânicos, bem como seus cuidadores, que avaliaram os comportamentos agressivos dos adolescentes.

Ao fazer testes estatísticos com base nas respostas, não foi encontrado apoio para a hipótese de que jogar jogos violentos aumenta a agressividade dos jovens. Também não foi observado nenhum limiar a partir do qual os jogos violentos se tornam prejudiciais para o comportamento agressivo. A partir desses resultados, os autores reforçaram a importância de que políticas públicas sejam baseadas em evidências sólidas sobre o uso da tecnologia pelos jovens.

Além disso, as evidências sobre políticas de prevenção de ataques em escolas não passam pelo monitoramento das opções de entretenimento consumidas por crianças e jovens. Alguns estudos apontam que uma das formas de prevenir e reduzir esse tipo de violência é monitorar os sinais de alerta como intenção de machucar outros, ressentimento e rejeição social dos potenciais agressores, por meio de uma rede de comunicação entre professores, alunos, pais e autoridades. Também é importante apoiar psicossocialmente os envolvidos nos tiroteios escolares, por meio de serviços de saúde mental, orientação e acompanhamento.

Outra medida é promover uma cultura de paz nas escolas, por meio de programas de educação para a cidadania, resolução de conflitos e prevenção ao bullying. Por fim, é essencial integrar as ações governamentais em diferentes níveis e setores, por meio de uma coordenação interinstitucional e intersetorial.

Portanto, a realidade vai na direção contrária ao que foi dito por Lula. É preocupante que o presidente ainda utilize argumentos ultrapassados e sem base científica para fugir da responsabilidade do governo na construção de políticas mais eficientes para o aumento da segurança nas escolas. Afinal, se a grande causa por trás desses ataques são os jogos violentos, caberia principalmente às famílias fazer o controle do entretenimento consumido pelos filhos.

Ao invés de promover o avanço de políticas públicas, o discurso que culpabiliza os videogames pela violência entre jovens reforça estereótipos negativos e pode levar a ações ineficazes. É importante que o governo deixe de desculpas e tome ações para desenvolver políticas adequadas que visem o bem-estar e a segurança dos jovens no ambiente escolar. Neste momento, o foco da agenda do governo deveria estar na importância da permanência na escola, do apoio emocional e psicológico, e da prevenção ao bullying, a fim de promover um ambiente mais saudável e seguro para as crianças e jovens.

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