Deborah Bizarria

Economista pela UFPE, estudou economia comportamental na Warwick University (Reino Unido); evangélica e coordenadora de Políticas Públicas do Livres

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Deborah Bizarria

Por uma reforma tributária sem privilégios

Alíquotas reduzidas contrariam o espírito de isonomia proposto pelo projeto

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O sistema tributário brasileiro atual é um emaranhado. As diferentes alíquotas para diferentes produtos para cada estado geram distorções de mercado e induzem agentes econômicos a tomar decisões baseadas em incentivos tributários, em vez de eficiência econômica. Além disso, a regressividade causada por impostos mais altos em produtos do que em serviços penaliza os mais pobres, contribuindo para o aumento da desigualdade de renda. A cumulatividade de impostos diminui a produtividade da indústria e gera custos adicionais. A burocracia tributária desloca recursos das empresas, prejudicando a produtividade e resultando em disputas sobre categorias de impostos na Justiça que somam trilhões de reais.

Com todos esses problemas do sistema vigente, não há dúvidas de que a reforma tributária vem em boa hora. Entretanto, grupos de pressão têm atrapalhado a tramitação da matéria no Congresso, convencendo senadores a lhes darem tratamento especial. O novo texto da reforma tributária, apresentado pelo relator na CCJ, prevê diversas alíquotas reduzidas, contrariando o espírito de isonomia proposto pelo próprio projeto.

Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) realiza reunião para leitura do relatório da PEC 45/2019
O senador Eduardo Braga (MDB-AM) durante discussão na CCJ sobre a reforma tributária - Roque de Sá/Agência Senado

Um dos privilégios incluídos é uma alíquota reduzida de 30% para serviços de profissão intelectual, fiscalizados por conselho profissional, ou seja, médicos e advogados que atuem fora do Simples Nacional. Outros regimes específicos com benefícios abrangem combustíveis e lubrificantes, concessão de rodovias, parques temáticos, bares, serviços de agência de viagem e turismo e transporte coletivo de passageiros.

Detratores da reforma utilizam como um de seus argumentos que teremos o maior Imposto de Valor Agregado (IVA) do mundo. Mas, como o projeto prevê neutralidade fiscal, se isso realmente ocorrer, será fruto principalmente da alta tributação sobre consumo que já temos hoje e da quantidade de exceções à regra geral. Afinal, quanto mais setores da sociedade quiserem um "desconto" nos seus impostos, maior será a taxa padrão para maior parte da sociedade. Então, o desafio é convencer os políticos brasileiros a não ceder a esses pedidos em nome de um sistema tributário mais justo e equitativo.

Além da óbvia injustiça, esse tratamento diferenciado gera problemas econômicos. Os preços são fundamentais para o funcionamento da economia, pois indicam as preferências dos consumidores, os custos dos produtores e um panorama geral de um mercado específico. Quando o governo interfere nos preços por meio de tributação especial para setores escolhidos, ele interfere no mecanismo de mercado, que é o melhor instrumento para alocar os recursos escassos de forma eficiente.

As desonerações setoriais distorcem os preços relativos dos bens e serviços, gerando incentivos errados e desperdícios de recursos. Por exemplo, se o governo reduz o imposto sobre um determinado produto, ele torna esse produto mais barato em relação aos demais, aumentando a sua demanda e reduzindo a demanda pelos substitutos. Isso pode levar a um excesso de consumo desse produto, criando situações de concorrência desleal, beneficiando alguns produtores em detrimento de outros, sem transparência e sem que isso se justifique por critérios técnicos ou sociais.

Não deve ser papel dos governos eleger setores ou empresas vencedoras em detrimento das demais. No entanto, se ainda assim decidirem que querem fazer um programa de incentivo, este deve ser previsto no Orçamento como gasto público, ter período predeterminado e avaliação de efetividade obrigatória. Como já mencionei em outro artigo, no Brasil há o costume de se conceder desonerações sem critérios e perpetuamente. No próprio relatório da reforma no Senado, o setor automotivo teve seus benefícios prorrogados até 2032.

A aprovação da reforma tributária é uma oportunidade única para simplificar, modernizar e tornar mais justo o sistema tributário brasileiro. Para que ela gere mais melhorias, é preciso que a sociedade pressione os políticos a resistirem aos de grupos de interesse que buscam manter ou ampliar seus benefícios fiscais.

Esses benefícios geram distorções econômicas, aumentam a desigualdade e prejudicam o crescimento e o desenvolvimento do país.

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