Djamila Ribeiro

Mestre em filosofia política pela Unifesp e coordenadora da coleção de livros Feminismos Plurais.

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Djamila Ribeiro
Descrição de chapéu Todas machismo

Pelos direitos das mulheres, pelo direito de todas nós

Na machocracia, não espantam o aborto proibido e o desprezo à luta por uma mulher no STF

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Nesta semana ocorreu o Dia Internacional para a Eliminação da Violência contra Mulheres.

Em 1999, a data foi estabelecida pela Assembleia-Geral da ONU em 25 de novembro, em memória das irmãs Mirabal –Pátria, Minerva e Maria Teresa—, também conhecidas como "As Borboletas", que foram assassinadas por serem opositoras à ditadura na República Dominicana, em 1960.

A mobilização em diversos países em torno do combate à misoginia encontra nesse momento uma oportunidade de poder de agenda. Em diversos países, mulheres saem às ruas para protestar contra uma violência global, enquanto instituições, empresas privadas, organizações e demais integrantes da sociedade civil anunciam medidas e campanhas de conscientização.

No governo federal brasileiro, uma das medidas de maior repercussão recente foi a campanha Brasil sem Misoginia, liderada pelo Ministério das Mulheres. Lançada oficialmente no mês de outubro, a campanha visa ações de conscientização da população sobre os efeitos do sistema de ódio e repulsa às mulheres.

A campanha terá uma missão enorme pela frente, pois os impactos da misoginia no país são inúmeros e alarmantes. Em 2023, o Brasil registrou somente no primeiro semestre mais de 700 feminicídios, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

É o maior índice de todos os levantamentos realizados pela organização e, em parte, decorre de um aumento de 33,7% dos casos no estado de São Paulo em comparação ao ano anterior.

No que se refere aos crimes de violência sexual, são mais de 34 mil casos de estupro de meninas e mulheres somente no primeiro semestre. Um verdadeiro escândalo. Some-se a isso a precarização nos últimos anos dos equipamentos públicos de atendimentos das mulheres –os quais, por sua vez, nunca foram suficientes, mas que, ainda assim, sofrem com constantes cortes de orçamento.

A ilustração apresenta a figura de três mulheres com punhos erguidos, elas usam blusas de cor verde-escuro e uma delas leva um megafone à boca.
Ilustração de Aline Bispo para coluna de Djamila Ribeiro de 30 de novembro de 2023 - Aline Bispo/Folhapress

De outro lado, a população feminina encarcerada quadruplicou em 20 anos, em função da Lei de Drogas de 2006, com impacto desproporcional a mulheres negras, como também é negra a grande maioria das mulheres mortas em tentativas de abortos inseguros. O aborto segue criminalizado, e suas exceções legais, como em caso de estupro, ainda são levadas à clandestinidade frente à dificuldade da mulher em dispor sobre o próprio corpo.

No campo da representação política, a repulsa às mulheres tem chegado a níveis que colocam o Brasil nos piores indicadores no continente americano. Segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral, mulheres são 17,7% da Câmara dos Deputados e 12,3% do Senado.

No caso dos municípios, 958 cidades não têm vereadoras eleitas e 58% das prefeitas afirmaram ter sofrido assédio ou violência política de gênero.

Nos outros Poderes a situação também não é animadora. A se concretizar a ida de mais um homem ao Supremo Tribunal Federal, a corte terá uma ministra e dez ministros na sua composição. Na foto celebrando a indicação do ministro e do próximo procurador-geral da República, outro homem, nove homens e nenhuma mulher sorriem para o fotógrafo, também homem.

Lula durante a indicação de Flávio Dino ao cargo de ministro do STF e de Paulo Gonet ao cargo de procurador-geral da República, no Palácio do Alvorada - Ricardo Stuckert - 27.nov.23/PR

Na administração federal, homens são a ampla maioria dos ocupantes de cargos de ministros, mas as mulheres são a maioria das demissões, sendo substituídas por homens.

A hegemonia masculina federal espelha a estrutura dos Poderes estaduais.

Nas empresas, mulheres são minorias em conselhos administrativos e cargos de liderança, e mesmo se ocupam espaço de poder e decisão, esse grupo tem de lidar com assédios sexuais, comentários sobre seu corpo e ridicularização da capacidade mental.

Nas religiões, homens são a grande maioria dos responsáveis pelo culto e pelas decisões. Nas redes sociais, mulheres em ascensão social, sobretudo mulheres negras, são alvo principal de comentários problemáticos. Nas empresas de jornalismo, mulheres são a minoria na posição de liderança.

Em uma machocracia, não espanta que o aborto seja proibido; que o número de estupro de mulheres e meninas não seja motivo de paralisação geral; ou ainda que a campanha por uma mulher negra no Supremo Tribunal Federal seja solenemente desprezada, entre tantas mostras de repulsa aos direitos das mulheres.

O que nos resta? Seguir na luta. Pelos direitos das mulheres, pelo direito de todas nós.

Cartaz da campanha Brasil sem Misoginia
Cartaz da campanha Brasil sem Misoginia - Divulgação

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