Djamila Ribeiro

Mestre em filosofia política pela Unifesp e coordenadora da coleção de livros Feminismos Plurais.

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Djamila Ribeiro

Carta aberta ao prefeito Ricardo Nunes

Uma medida está colocando em risco o serviço de acolhimento às mulheres

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Desde 2022, coordeno o Espaço Feminismos Plurais, associação sem fins lucrativos com sede em Moema. O Instituto oferece uma gama de serviços voltados principalmente para mulheres em situação de vulnerabilidade social. Uma das iniciativas mais exitosas é a parceria com a Casa Rosângela Rigo, o primeiro equipamento público da cidade de São Paulo voltado ao acolhimento de mulheres vítimas de violência doméstica.

Criada em 2016, a casa atende mulheres em situação de violência que não estejam sob risco iminente de morte, com equipe técnica à disposição 24h, segurança da Guarda Civil Metropolitana. Por licitação, sua administração é feita pela União Popular de Mulheres de Campo Limpo e Adjacências, uma organização da sociedade civil sem fins lucrativos voltada ao enfrentamento da violência contra mulheres, com trajetória de 36 anos de lutas sociais na garantia de direitos.

Pela parceria entre o Espaço Feminismos Plurais e a Casa Rosângela Rigo, são oferecidas a essas mulheres atendimento psicológicos e terapêuticos. Além disso, também são oferecidos serviços de apoio às trabalhadoras desse espaço no projeto "Cuidando de quem cuida", que promove, além do atendimento individual, o trabalho psicológico em rodas de conversa e acolhimento.

Aline Souza

Essa parceria foi uma oportunidade de conhecer de perto o importante trabalho da Casa e a sua gestora Rosilene Pimentel, com quem estabelecemos, além do trabalho conjunto, admiração pela sensibilidade e cuidado. A população em geral precisa conhecer o excelente trabalho desenvolvido pela casa de acolhimento, uma iniciativa que, em nossa perspectiva, deveria ser apoiada e ampliada, afinal são incontáveis as mulheres que só não saem de casa, um ambiente de violência, por não terem para onde ir. E também pela dificuldade dessas mulheres de sair com seus filhos e filhas, alguns ainda de colo, uma vez que não há equipamentos públicos suficientes adequados para recebê-las.

Logo, ainda que insuficiente tamanha a dimensão do grave problema social experimentado pelas mulheres da cidade de São Paulo e de todo país, a Casa Rosângela Rigo é um bálsamo para muitas que conseguiram nela se abrigar. É uma iniciativa de vanguarda.

Além de proteger a identidade dessas mulheres, muitas vezes abrigadas da perseguição masculina que não aceita a saída delas de casa, a Casa desempenha um trabalho fundamental de encaminhamento profissional e educacional das beneficiárias e de seus filhos e filhas.

Em sete anos de trabalho, mais de 2.000 mulheres e crianças foram acolhidas. Um trabalho que deveria ser sofisticado e que seria fundamental para o desenvolvimento de toda a cidade de São Paulo.

Seria, não fosse uma medida da Prefeitura de São Paulo que está colocando toda a política em risco. Refiro-me ao Edital de Chamamento Público nº 003/SMADS/2023, que transfere a casa de acolhimento da Secretaria de Direitos Humanos para a Secretaria de Assistência Social, sem nenhum debate com as diretoras, trabalhadoras ou beneficiárias.

Mas vai além. O edital reduz o número de assistentes sociais e psicólogas, ao passo que aumenta a capacidade de atendimento. A precarização é lógica e as consequências serão a perda da capacidade de acolhimento técnico, a superlotação do espaço e a deterioração do serviço.

O edital ainda reduz em 30% a verba mensal de custeio e retira o serviço de segurança pública e de transporte das mulheres e crianças. É bom que se diga que a verba atual é no limite do limite para adimplemento das obrigações da Casa com as funcionárias e com a estrutura necessária para receber essas mulheres. Reduzir 30% leva à impossibilidade do prosseguimento do serviço.

Por isso, a União Popular de Mulheres do Campo Limpo se manifestou em Carta Aberta sobre os motivos pelos quais não vai participar do edital. Aliás, até o presente momento, não há notícias de candidaturas ao Edital aberto.

Nos termos do edital, as trabalhadoras serão dispensadas e a Casa não prosseguirá suas atividades. Se prosseguir, será outra política, precária e de aparência. Como noticiado nesta Folha, todas as formas de violência contra a mulher aumentaram no Brasil em 2022. Diante deste cenário, é dever do poder público não somente ampliar a rede de enfrentamento à violência contra a mulher, mas melhorar a qualidade.

Faço um apelo à consciência do prefeito de São Paulo: cancele este edital. Valorize a Casa Rosângela Rigo e suas trabalhadoras. Amplie e seja responsável pela melhoria do serviço de acolhimento às mulheres.

Os direitos das mulheres não podem ser precarizados.

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