O mercado automotivo voltou no tempo em abril. Os dez primeiros dias confirmam as previsões: com a limitação de funcionamento das concessionárias e dos Detrans devido à pandemia do novo coronavírus, o licenciamento de carros novos cai aproximadamente 80% em relação ao mesmo mês de 2019.
Líder de vendas, o Chevrolet Onix registrou 1.150 emplacamentos neste período, soma das versões hatch e sedã. Nesse ritmo, deve chegar ao dia 30 com 3.500 unidades comercializadas.
Essa foi a média mensal do Volkswagen Fusca em 1963, que então era o automóvel mais emplacado do Brasil.
É preciso considerar que havia poucas opções entre os carros novos, o que fazia o percentual de participação do Volks ser bem maior que o do Chevrolet hoje. Apesar dessa distorção, é um dado que mostra o tamanho do problema.
Caso as vendas caiam exatos 80% em abril, serão comercializados 46,4 mil carros de passeio, comerciais leves, ônibus e caminhões neste período.
O cálculo é baseado em dados da Fenabrave (entidade que representa as distribuidoras) e se aproxima da média mensal de licenciamentos de 1972, ano em que 601,4 mil veículos foram emplacados.
Naquela época, a jovem indústria automotiva nacional tinha 1/5 da capacidade atual e vivia do mercado interno. As montadoras geravam, proporcionalmente, mais empregos. Isso se devia ao menor desenvolvimento tecnológico, com fábricas pouco automatizadas. Por outro lado, a cadeia de fornecedores, revendedores e reparadores era bem mais curta que a atual.
Uma volta no tempo como a que ocorre agora não é apenas uma curiosidade de almanaque. Há muito mais gente por trás dos números em uma indústria que envolve, de forma direta ou indireta, cerca de 1 milhão de empregados.
Nos anos de bonança, as montadoras instaladas no Brasil remetiam seus lucros às matrizes. O dinheiro voltou a fundo perdido para manter os investimentos na segunda metade desta década, durante uma crise que ainda não foi superada. Com o coronavírus, falta dinheiro lá e cá.
Até o fim deste ano, na média, o mercado automotivo deverá ter regredido a níveis de produção e vendas registrados no início dos anos 2000. Isso pode cobrar seu preço em desemprego, que será mais visível nos entornos das montadoras. É lá que estão os fornecedores de diferentes níveis e de nomes desconhecidos do grande público, que fazem de tapetes a componentes eletrônicos.
A solução para esse problema ainda não foi definida, mas vai exigir um olhar que vá além do estímulo às vendas para alavancar a retomada. Indústria e governo precisam de um plano que faça o setor automotivo voltar ao século 21.
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