Esper Kallás

Médico infectologista, é professor titular do departamento de moléstias infecciosas e parasitárias da Faculdade de Medicina da USP e pesquisador na mesma universidade.

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Esper Kallás
Descrição de chapéu Coronavírus

Tive Covid-19. Estou protegido?

A polêmica sobre o passaporte de imunidade ainda não tem respostas definitivas

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Na última semana, ganhou força um debate sobre a pandemia. Será que uma pessoa que já pegou a Covid-19 está protegida ou pode se contaminar novamente? As implicações dessa resposta são imensas.

Qualquer vírus apresenta um ritmo de mutação. São modificações no material genético que permitem dizer, entre outras coisas, de onde o vírus veio e quais os caminhos que está trilhando em sua disseminação. Foi possível, por exemplo, documentar que o primeiro coronavírus brasileiro causador da Covid-19, identificado e sequenciado pelo grupo da USP e do Instituto Adolfo Lutz, é idêntico a outro da região da Lombardia, permitindo a definição de que o primeiro caso veio exatamente da Itália.

Ao compararmos alguns diferentes vírus encontraremos exemplos dos que sofrem muitas mutações, como o HIV, e outros que apresentam poucas mutações, como o vírus da poliomielite ou o do sarampo.

Vale aqui uma discussão sobre o germe que causa gripe, o influenza. Comparado a outros vírus de doenças respiratórias, ele pode trocar seu material genético com facilidade. Essa habilidade faz com que, a cada ano, ele reapareça com características genéticas diferentes. É como se ele apresentasse seu material genético como um deque de cartas de baralho, que podem ser misturadas e rearranjadas entre si. Quanto maior a reconfiguração de seu código genético, maior a chance de que cause uma pandemia. Foi o que aconteceu em 2009, quando nos deparamos com a gripe suína.

O novo coronavírus, segundo milhares de sequências genéticas até o momento, não apresenta grandes mutações quando comparado aos outros vírus respiratórios conhecidos. Isso sugere que não deve haver mudanças significativas em seu comportamento durante a pandemia de Covid-19.

Nosso sistema de defesa aprendeu evolutivamente a combater a infecção viral produzindo anticorpos e recrutando outros tipos de células, promovendo o que conhecemos como “imunidade protetora”. Uma das implicações desse comportamento é que se espera que um paciente que se recuperou da Covid-19 não tenha novamente a doença.

Até hoje, não há nenhuma pessoa que, comprovadamente, tenha tido Covid-19 mais de uma vez. Há relatos de pacientes que apresentam testes (de PCR) positivos para detecção de material genético do vírus depois do desaparecimento dos sintomas. E esses testes podem permanecer positivos por semanas ou até meses.

Mas esses achados devem ser observados com cautela, pois parecem antes significar que algumas pessoas abrigam o material genético viral de forma mais persistente, não que o vírus esteja se multiplicando.

Também estamos aprendendo que a maioria das pessoas consegue produzir anticorpos depois de ser exposta a Covid-19. Podemos considerar que uma pessoa que produz anticorpos contra o novo coronavírus está protegida? A resposta mais provável parece ser “sim”. Isso tornaria possível a desejada adoção de um “passaporte de imunidade”.

O que falta para termos certeza de que o “passaporte de imunidade” é seguro? A formação de anticorpos seria equivalente em pacientes assintomáticos ou que tiveram infecções leves comparados aos que têm doença grave? Quanto tempo dura a defesa depois da infecção? Alguém pode ter Covid-19 mais de uma vez? Qual a porcentagem de pessoas que precisa ter defesa para que o vírus não circule? Vacinas podem cumprir esse papel?

A adoção do passaporte de imunidade parece viável, mas o que sabemos sobre o novo coronavírus ainda tem lacunas, que podem exigir readequações de seu uso.

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