Esper Kallás

Médico infectologista, é professor titular do departamento de moléstias infecciosas e parasitárias da Faculdade de Medicina da USP e pesquisador na mesma universidade.

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Esper Kallás
Descrição de chapéu Coronavírus

As reinfecções pelo novo coronavírus

Pessoas que desenvolvem Covid-19 mais de uma vez abrem novas discussões

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Infecções por vírus induzem uma resposta do nosso sistema imune: além de atacar o patógeno em sua primeira entrada no organismo, promovem proteção contra o mesmo, para outras vezes em que eventualmente nos deparemos com ele. Isso é o que denominamos “memória imune”.

A grande maioria dos vírus desencadeia esse comportamento. O vírus do sarampo, por exemplo, depois de acometer uma criança com sua doença, induz imunidade duradoura, protegendo-a pelo resto da vida.

Mas há exceções. Algumas pessoas têm dificuldade em guardar essa memória, quer seja porque possuem algum “defeito” prévio em seu sistema imune ou, ainda, por causa de algum fator que possa ter provocado um “enfraquecimento” deste. Remédios para tratar alguns tipos de câncer ou medicações imunossupressoras, usadas em pessoas que receberam transplantes de órgãos, por exemplo, podem debilitar o sistema de defesa, permanente ou temporariamente.

Desde o começo da pandemia, sob o olhar vigilante de inúmeras plataformas de estudos internacionais, considerava-se que a imensa maioria dos mais de 37 milhões de pacientes registrados com Covid-19 tiveram uma única ocorrência de infecção documentada. Uma única vez, em cada pessoa. Por tais observações, a comunidade científica já dava como muito provável a hipótese de que uma primeira infecção fosse o bastante para que a proteção fosse atingida.

Essa hipótese recebeu um duro golpe: um paciente de Hong Kong, apresentando o primeiro episódio bem documentado de reinfecção. Depois dele, outros três foram confirmados e cerca de 20 casos suspeitos já foram descritos.

No Hospital das Clínicas da USP, em São Paulo, um ambulatório foi especialmente criado para avaliar casos suspeitos de reinfecção pelo novo coronavírus. Em poucas semanas, 28 casos foram incluídos e estão sob investigação. Soma-se a eles a apuração de outros casos relatados por infectologistas, que descrevem pacientes em situações semelhantes —muitos deles, sem quaisquer evidências de deficiência prévia do sistema imune.

Embora todos esses eventos pareçam ser raros e ainda sem impacto significativo sobre os números da pandemia, mediante a enorme maioria de casos únicos de infecção, acendeu-se uma luz amarela.

O que poderia estar por trás desses casos pontuais de reinfecção?

Reinfecções já acontecem com os outros quatro tipos de coronavírus que acometem os humanos e causam resfriado comum, e as razões para isso ainda não são bem conhecidas. Uma das hipóteses é a de que o sistema de defesa teria certa dificuldade em enxergar os coronavírus, uma vez que todos eles, inclusive o novo coronavírus, multiplicam-se preferencialmente na superfície do sistema respiratório, na maioria dos infectados. Uma das possíveis explicações é que essa é uma região superficial, para que o sistema imune perceba a presença do vírus.

Ainda não são conhecidos todos os mecanismos que permitem aos coronavírus escapar da resposta imune. Agora, com os casos de reinfecção, surgem dúvidas sobre as implicações para os estudos das vacinas. Serão elas capazes de impedir os segundos episódios de infecção? A proteção induzida pela vacina seria melhor que a infecção natural pelo novo coronavírus? Ou os episódios de reinfecção são uma mostra de que teremos uma percentagem de infectados e vacinados que não seriam capazes de ficar protegidos depois de um certo período?

O acompanhamento a longo prazo de pacientes que tiveram Covid-19 e os estudos de fase 3 com produtos candidatos a vacinas que estão em andamento nos trarão estas respostas.

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