Fernando Canzian

Jornalista, autor de "Desastre Global - Um Ano na Pior Crise desde 1929". Vencedor de quatro prêmios Esso.

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Fernando Canzian
Descrição de chapéu Eleições 2018

Bolsonaro é maçã pronta para cair, só que veio bichada

Brasileiros parecem desejar governo de orientação mais liberal; problema é o que vem junto

Nas ciências humanas apela-se à imagem de maçãs maduras caindo de árvores quando ideias semelhantes aparecem, ao mesmo tempo, em locais diferentes e sem relação aparente.

O Brasil que pode eleger Jair Bolsonaro parece pronto para alguém com seu discurso: contra a corrupção e a favor de um projeto econômico liberal, com menos Estado e mais iniciativa privada.

Desde a redemocratização, o Brasil segue um caminho que faz sentido do ponto de vista evolutivo, mesmo que vagarosamente, na direção das economias liberais mais desenvolvidas.

Com o fim da ditadura militar em 1985, experimentamos governos de transição para a democracia (Sarney), de uma primeira tentativa de abrir a economia para o mundo (Collor), de estabilização necessária da moeda (Itamar e FHC) e de distribuição de renda e inclusão com responsabilidade orçamentária (Lula).

O desvio no caminho ficou por conta de Dilma, e o preço foi alto: maior recessão da história, causada por um intervencionismo e descontrole fiscal que muitos julgavam ultrapassados.

Nos dez anos que antecederam o início do desastre de Dilma 2, houve expressiva melhora na renda, segundo dados da FGV Social. A dos 10% mais pobres aumentou 129% acima da inflação e a dos 10% mais ricos, 32%.

Na análise do que mais contribuiu para esse avanço, o trabalho foi preponderante: 79% da melhora na renda se deu pelo esforço dos brasileiros, 19% por benefícios previdenciários e 3% pelo Bolsa Família.

Lula também implementou vários programas (Luz para Todos, ProUni etc.) que custaram caro. Mas que puderam ser financiados com mais arrecadação tributária, que cresceu em um ambiente amigável ao mercado e de muito trabalho no setor privado.

Depois dessa experiência em que o esforço pessoal trouxe resultados concretos, é normal que os brasileiros a queiram de volta. E que misturem as razões do atual fracasso econômico à corrupção (identificada com o PT) que ficou evidente enquanto a recessão (do PT) se instalava.

É nessa onda que Bolsonaro surfa com sua nova prancha liberal mesmo sem nunca ter entrado nesse mar. Em seus 27 anos como deputado, votou contra o Plano Real, a privatização da telefonia e a reforma previdenciária de FHC, mesmos temas rejeitados pelo PT.

Sua conversão liberal hoje, porém, faz todo sentido do ponto de vista eleitoral e prático, com discurso de valorização do setor privado, Estado menor e mais produtividade. Nesse campo, João Amoêdo (Novo) foi outra maçã desta eleição.

O maior problema de Bolsonaro, no entanto, não é o fato de ser um “cristão novo” do liberalismo que o país parece desejar.

Mas o fato de ser do mesmo tipo das outras maçãs que têm caído por aí, como Donald Trump nos EUA e Viktor Orban na Hungria, bichadas por uma postura de confronto contra as mesmas instituições que permitiram que chegassem ao poder.

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