Giovana Madalosso

Escritora, roteirista e uma das idealizadoras do movimento Um Grande Dia para as Escritoras.

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Giovana Madalosso

Paz, amor e destruição na Chapada dos Veadeiros

De um lado, cantos xamânicos e adoração à natureza; de outro, queimadas abrindo solo para produção agrícola

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Neste mês pousei meu disco voador na Chapada dos Veadeiros. Cheguei em missão de paz, só querendo curtir a natureza e relaxar com a minha família, mas encontrei um lugar muito mais curioso do que imaginava, com comunidades alternativas, feirinhas esotéricas e Ets por todos os lados.

Alçados a símbolo da região, os extraterrestres estampam camisetas e chaveiros, enfeitam uma nave de plástico na praça central e fazem prosperar o comércio local. Em uma tabacaria, lê-se: vendemos seda e consertamos discos voadores.

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Chapada dos Veadeiros, em Alto Paraíso de Goiás (GO) - Ana Botallo - 21.fev.22/Folhapress

A inclinação extraterrena não vem do nada. Segundo uma pesquisa da Nasa, a chapada é a área com maior luminosidade quando vista da órbita da terra, graças ao seu solo cheio de cristais.

Além disso, como indica uma placa de estrada, por ali passa o Paralelo 14, uma linha imaginária que corta diversos pontos sagrados do planeta, como Machu Picchu.

Também é nessa região que se reuniam os Cavaleiros de Maytrea, acreditando ser esse o lugar ideal para se salvar do apocalipse. E, quem sabe, embarcar num óvni. Para completar, o Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, considerado Patrimônio Mundial Natural pela Unesco, descortina um cenário inspirador para todo tipo de mística, bem como as formações rochosas do vizinho Vale da Lua.

Tudo isso fez com que uma população e um turismo verde e new age prosperasse nessa parte da chapada, criando uma terra que contrasta com outros hábitos arraigados em seu solo.

De um lado, cantos xamânicos e adoração à natureza. De outro, as queimadas abrindo solo para produção agrícola e muitas vezes se alastrando e dizimando flora e fauna local —o cerrado é o bioma que mais perdeu de área nos últimos anos, batendo em 50%. De um lado, os restaurantes veganos e a produção de orgânicos. De outro, a agropecuária e monoculturas, como a soja.

De um lado, geólogos e biólogos lutando pela preservação. De outro, responsáveis pelo desmatamento –quem sabe bebendo no mesmo balcão de bar.

Nas esquinas, a reminiscência da contracultura. No entorno, a vitória do sistema, em forma da máquina que tudo dilapida. E, no meio, tudo isso misturado junto.

Antes da minha partida, visitei um lugar peculiar. Uma construção em forma de gota, voltada para música e meditação. De olhos fechados, tentando seguir os cantos puxados pela cítara, consegui me conectar com uma extraterrestre: eu mesma, que vivo viajando por outros planetas e quase nunca conseguindo aterrissar plenamente dentro de mim.

Com a alma encaixada pela música e lavada pelos banhos de cachoeira, peguei a estrada para ir embora, em direção a Brasília. Num certo momento, vi uma fumaça no acostamento. Era um incêndio de natureza desconhecida. A fumaça, de muitos metros de altura e largura, cada vez mais densa e preta como piche, invadiu a estrada, bloqueando totalmente a visão dos motoristas.

Num comboio lento e cuidadoso, fomos cruzando aquela névoa, sem saber o que havia do outro lado. Achei a imagem simbólica: estamos também atravessando a névoa da destruição ambiental e da mudança climática, sem saber o que nos espera pela frente. Haja misticismo e crença em vida fora da Terra para dar conta de tudo isso.

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