Helio Beltrão

Engenheiro com especialização em finanças e MBA na universidade Columbia, é presidente do instituto Mises Brasil.

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Helio Beltrão

O martelo do Fed

A 1ª fase é a da liquidez, que estamos vivendo; a próxima será a de (in)solvência

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Donald Trump e muitos especialistas como o presidente-executivo do Citibank mundial, Michael Corbat, têm afirmado que esta não é uma crise de natureza financeira, como a de 2008. Afinal, iniciou-se devido ao coronavírus e tem efeitos concentrados na economia real, sem afetar os bancos que possuem sólido colchão de capital, segundo afirmam.

Não haveria motivo, portanto, para se preocupar com o “sistema circulatório” da economia, que é o sistema bancário ancorado no dólar, a reserva de valor do mundo.

Isso demonstra desconhecimento sobre o sistema financeiro internacional e os baixíssimos níveis de capital dos bancos. Em 2008, um problema de inadimplência localizado no mercado de hipotecas de qualidade mais baixa, o subprime, se propagou para o mercado de crédito e dali contaminou os maiores bancos, que tiveram o equivalente a um ataque cardíaco.

Mais de um ano antes da falência estrondosa do Lehman Brothers, em 15 de setembro de 2008, já pipocavam anomalias. Em julho e agosto de 2007, houve perdas de 20% a 30% em fundos multimercados do Goldman Sachs e do BNP Paribas, e o Banco Central Europeu injetou US$ 130 bilhões nos bancos europeus. Poucos se deram conta da importância desses sinais ou anteciparam o que viria em seguida.

O sistema baseado no dólar é altamente endividado e alavancado, sustentado artificialmente pelas injeções de dinheiro criado do nada pelo Fed (Federal Reserve), que atuam como uma bomba de sangue externa que busca acelerar a circulação enquanto administra heroína para que o paciente não perceba o truque.

O cidadão americano é altamente endividado em empréstimos de automóveis, de cartões de crédito, de empréstimos para estudantes e hipotecas.

Adicionalmente, as empresas estão endividadas, em particular as que produzem petróleo e gás a partir de xisto betuminoso, que sofrerão inadimplência em razão dos preços deprimidos decorrentes da guerra de preços do petróleo. Com o rebaixamento das notas de crédito das empresas pelas agências de rating, é de esperar inadimplência adicional.

Essa pressão de inadimplência que parte da economia real é muito grande em comparação com o dinheiro disponível no sistema. “Cash is king”, ou “o dinheiro vivo é rei”, e a busca de todo o mundo por manter o dinheiro no bolso devido à incerteza detona um infarto.

O principal indicador do estresse de liquidez no sistema bancário é o Libor-IOS ou TED Spread, que indica quanto os maiores bancos do mundo têm que prometer de rendimento (acima da taxa livre de risco) em seus CDBs de três meses.

Historicamente é um tedioso indicador que pode permanecer por longos anos no intervalo entre 20 e 30 pontos, nos períodos de normalidade. Porém, é o mais poderoso indicador antecedente de crises, na minha opinião.

No episódio em 2007 que referi acima, o indicador superou 60 pontos em agosto e permaneceu entre 60 e 100 durante todo o período até a falência da Lehman.

Nesta crise atual, as anomalias surgiram com a crise do mercado de compromissadas, as repo, no fim do ano passado, quando o indicador atingiu preocupantes 40 pontos.

No início de março, os fundos de renda fixa de baixíssimo risco (conforme são propagandeados) do Goldman e do Bank of New York foram socorridos por seus gestores, que doaram, respectivamente, US$ 1,9 bilhão e US$ 1,2 bilhão para garantir que a cota não caísse.

O Fed está tentando se contrapor ao aperto injetando trilhões no sistema, mas não parece estar surtindo o efeito desejado. O indicador estava nesta terça-feira (7) acima de 120 pontos.

A primeira fase é a da liquidez, que estamos vivendo. A próxima será a de (in)solvência. A desalavancagem purificadora decorrente da insustentabilidade da heroína financeira é uma síndrome que não tem remédio.

Para quem é martelo, como o Fed, tudo é prego. Vem mais heroína por aí.​

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