Apesar de o populismo anti-intelectualista estar em alta no mundo, é ao conhecimento científico que devemos agradecer por viver numa época de prosperidade e segurança. A maioria dos itens alimentícios que você adquire no supermercado pode ser consumida sem problemas. Nem sempre foi assim.

Nossa ignorância atávica sobre doenças infecciosas, aliada a intuições bastante imperfeitas em relação à higiene, fazia com que beber até mesmo água estocada por algumas horas fosse perigoso. Na Europa medieval, o líquido mais seguro que se podia ingerir era a cerveja. O processo de fermentação elimina boa parte das bactérias patogênicas. Como consequência, tomava-se cerveja até no café da manhã.

O leite então era uma verdadeira arma de destruição em massa, especialmente nos meses de calor. A humanidade só sobreviveu porque, por tentativa e erro, foi descobrindo métodos mais seguros de se alimentar. No caso dos laticínios, a resposta são iogurtes e queijos, que não estragam tão facilmente quanto o leite cru. Bônus adicional, esses derivados não têm tanta lactose, facilitando a vida dos cerca de 60% dos humanos que não toleram bem esse açúcar.

Em “Milk!”, seu mais recente livro, o jornalista Mark Kurlansky nos faz viajar pelas mais diversas paisagens, do Tibete à Islândia, destrinchando 10 mil anos de relacionamento íntimo entre humanos e os animais que lhes fornecem leite. Conta histórias fascinantes e oferece mais de uma centena de receitas de produtos e pratos à base desse fluido corporal comestível. Mostra como algumas das polêmicas que até hoje cercam o leite (amamentar no peito ou dar a mamadeira?) são eternas. 

Foi só a partir do século 19, com o trabalho de cientistas como Louis Pasteur, que finalmente entendemos por que tomar um copo de leite podia ser mortal e desenvolvemos soluções tecnológicas para o problema. Cuidado com as regressões que deseja.