Hélio Schwartsman

Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".

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Hélio Schwartsman
Descrição de chapéu Folhajus LGBTQIA+

Idioma pétreo

Proibir políticos de legislar sobre idioma deveria ser cláusula pétrea

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O STF fez bem em declarar inconstitucional a lei de Rondônia que bania a linguagem neutra das escolas. Se há uma norma que eu não hesitaria em tornar cláusula pétrea é uma que proíba políticos de legislar sobre o idioma.

Daí não decorre que eu morra de amores pela linguagem neutra. Sou solidário às dores da comunidade trans, mas não creio que o idioma seja o lugar para esse tipo de batalha. Penso até que a lógica que preside ao neutralismo é rasteira e, no limite, preconceituosa. Está se dizendo, afinal, que o "o" é um sinal distintivo da masculinidade, e o "a", da feminilidade, o que deixa órfãos os que não se encaixam em nenhum dos dois. Mas, assim como nem todos os indivíduos se conformam ao binarismo macho/fêmea, nem todo "o"/"a" designa inequivocamente um gênero gramatical. Vocábulos de origem grega terminados em "ema" (fonema, telefonema), por exemplo, são todos masculinos, apesar do "a" final. Forçar uma distinção a priori às palavras não é, no método, diferente de impor modelos fixos de sexualidade às pessoas.

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Ônibus escolar em frente a uma escola em Cujubim Grande, em Rondônia - Beethoven Delano - 18.dez.2019/Folhapress - Folhapress

Mas o que eu, o militante ou o legislador pensamos é irrelevante. Idiomas evoluem segundo padrões que se assemelham mais aos da seleção natural que aos de processos dirigidos. Cada usuário de uma língua imprime suas idiossincrasias a ela. A esmagadora maioria dessas "mutações" será rejeitada; algumas poucas, conservadas. É só ao longo dos séculos que as mudanças se tornam perceptíveis.

E, se já não é fácil emplacar palavras que durem (alguém se lembra de "anidropodoteca"?), bem mais difícil é fixar mudanças no nível da concordância, isto é, da sintaxe, campo em que os idiomas ficam ainda mais seletivos.

Meu palpite é que, no futuro, a linguagem neutra não passará de curiosidade histórica. Mas, ao contrário das mutações biológicas, que podem originar cânceres, as linguísticas não fazem mal. Não há razão para impedir as pessoas de falar como preferirem.

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