Teólogos e astrobiólogos têm um problema comum. É possível que seus objetos de estudo, respectivamente Deus e vida alienígena, não existam e, mesmo que existam, nunca se façam cognoscíveis para nós. Mas astrobiólogos tentam desenvolver uma física adequada para lidar com a dificuldade.
Essa pelo menos é a proposta de "Life As No One Knows It" (vida como ninguém conhece), da física teórica convertida em astrobióloga Sara Imari Walker.
Walker, que foi orientanda do físico brasileiro Marcelo Gleiser, começa mapeando os problemas de sua área. Não existe definição de vida que pare em pé. Uma das mais populares, como a que diz que vida são sistemas químicos autossustentáveis capazes de evolução darwiniana, exclui bilhões de abelhas operárias, já que elas não se reproduzem.
E fica pior. Se a vida alienígena tiver base numa química muito diferente da nossa, é possível que nós não consigamos nem reconhecê-la caso topemos com ela.
Walker sugere que abandonemos a busca de definições e nos contentemos, à moda de Turing, com um teste para separar produtos abióticos de coisas vivas. Para a autora, a teoria da montagem, que ela ajudou a desenvolver, faz isso. Seleção gera complexidade. Então, entidades que exijam muitos passos (tipicamente mais de 15) para ser construídas devem ser consideradas como de origem viva.
Vale notar que, sob essa perspectiva, a vida não é algo binário, mas vem num espectro. A proposta abarca não só seres vivos mas também coisas que eles constroem, como satélites e inteligência artificial. Com a teoria da montagem, Walker diz ser possível desenvolver uma nova física, formalizável, mensurável e falseável, capaz de lidar com a vida como nós não conhecemos.
A teoria da montagem é algo novo e, portanto, polêmico. Ao vender seu peixe, a autora faz ótimas observações sobre filosofia da ciência e nos coloca a par dos últimos desenvolvimentos na pesquisa sobre as origens da vida e em astrobiologia. Vale a leitura.
PS – Dou três semanas de férias ao leitor
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