Ian Bremmer

Fundador e presidente do Eurasia Group, consultoria de risco político dos EUA, e colunista da revista Time.

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Relações comerciais de EUA e China rumam para dificuldades 

Mesmo sem guerra econômica, muitos danos podem ser causados

O líder chinês, Xi Jinping, cumprimenta o presidente dos EUA, Donald Trump, ao recebê-lo no Grande Salão do Povo em Pequim, em novembro
O líder chinês, Xi Jinping, cumprimenta o presidente dos EUA, Donald Trump, ao recebê-lo no Grande Salão do Povo em Pequim, em novembro - Andy Wong - 9.nov.2017/Associated Press

Em Davos e durante seu recente Discurso sobre o Estado da União, Donald  Trump deixou claro que pretende ser mais duro com a China. Este presidente americano tem uma "mentalidade antiquada da Guerra Fria", reagiu o ministro das Relações Exteriores chinês.

As relações comerciais e de investimentos entre as duas maiores economias do mundo rumam para dificuldades. Trump não quer uma guerra comercial em grande escala. Nem Pequim. Mesmo que isso não aconteça, porém, muitos danos podem ser causados.

Desde que anunciou sua candidatura presidencial em 2015, o presidente Trump se apresentou aos eleitores americanos como o fazedor de negócios consumado, um defensor mais duro, astuto e melhor da população americana do que qualquer presidente anterior, democrata ou republicano.

Ele sabe que sua popularidade, suas chances de se reeleger e seu legado presidencial dependem de sua capacidade para promover os interesses dos eleitores que acreditam que a concorrência comercial minou sua vida e seu ganha-pão. Nessa arena, a China em rápida ascensão e sua economia estatal surgem como os adversários máximos.

Trump começou a argumentar que segurança econômica é segurança nacional. Essa é sua advertência a Pequim, que endireitar os erros nas relações comerciais e de investimentos entre EUA e China é sua maior prioridade. Seus primeiros movimentos incluirão anúncios de atos de reforço econômico e restrições ao investimento chinês nas próximas semanas.

Haverá uma constante discussão entre o Congresso e a Casa Branca sobre a melhor maneira de reformular o processo pelo qual o governo americano aprova propostas de investimento estrangeiro. Trump também pressionará Pequim para que modifique as regras que obrigam as empresas americanas a transferir propriedade intelectual (PI) para obter acesso aos mercados chineses e pôr fim ao roubo de PI.

Com essas mudanças, Trump espera impor dificuldades suficientes à China e às empresas chinesas para forçar Pequim a levar mais a sério as queixas comerciais dos EUA. Ele começará com anúncios de novas tarifas e outras restrições a produtos chineses que entram nos EUA.

Só se essas medidas não conseguirem obter concessões ele ameaçará dificultar a operação e os investimentos das empresas chinesas nos EUA. Essas medidas cuidadosamente calibradas se destinam menos a punir a China do que a pressionar seus negociadores a sentar-se à mesa.

A China reagirá primeiro com críticas e desafios, mas ambos serão limitados para evitar provocações desnecessárias. O presidente Xi  Jinping projetará seu governo como um líder global em comércio e investimentos interfronteiras, e advertirá que Washington está seguindo um perigoso caminho protecionista. A China certamente contestará os atos dos EUA na Organização Mundial do Comércio.

Ele também testará o limite de dor dos EUA. As empresas americanas em muitos setores enfrentarão novas restrições formais, mas também auditorias, inspeções e outras formas de ataque burocrático que poderão levar a comunidade empresarial americana a pressionar Trump a ser mais gentil. Em particular, o governo de cada país visará as companhias de tecnologia do outro.

Os dois lados têm bons motivos para fazer compromissos. Xi  Jinping resistirá a mudanças que impeçam o governo chinês de subsidiar firmas chinesas que possam ajudar a construir uma economia moderna, tecnologicamente dinâmica.

Mas ele também não tentará enfraquecer a moeda chinesa para ter vantagens táticas ou ordenará uma desaceleração acentuada na compra de títulos do Tesouro dos EUA para aumentar a aposta. Os dois atos seriam prejudiciais.

Xi provavelmente apelará diretamente a Trump com promessas de dar às empresas americanas maior acesso aos mercados chineses sem obrigá-las a compartilhar PI e tecnologia. Trump também tem motivos para fazer compromissos. Ele quer conquistar concessões da China para declarar vitória sem ameaçar os fortes números econômicos que, segundo acredita, poderiam melhorar sua popularidade.

Aqui está o problema: cada lado crê que o outro é mais vulnerável. As autoridades de Trump pensam que a China precisa de acesso contínuo aos mercados americanos para evitar uma desaceleração econômica acentuada que poderia provocar uma crise política.

As autoridades chinesas acreditam que seu presidente é muito menos vulnerável a pressões que Trump, que deve escutar as constantes queixas dos líderes empresariais americanos e enfrentará de novo os eleitores em breve. O risco de conflito aumenta quando cada lado acredita que tem mais trunfos.

Não espere uma solução rápida. Nenhum lado quer parecer fraco, em casa ou no exterior. Os atritos EUA-China provavelmente irão além deste ano.

Dada a importância das relações entre as duas potências —a China em ascensão e os EUA já estabelecidos, e para toda a economia global—, vamos esperar que Donald  Trump e Xi  Jinping encontrem um terreno comum com espaço suficiente para ambos se posicionarem com orgulho.

Tradução de LUIZ ROBERTO MENDES GONÇALVES

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