Ian Bremmer

Fundador e presidente do Eurasia Group, consultoria de risco político dos EUA, e colunista da revista Time.

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Política no tempo do coronavírus

Em lugar de resposta global, países são forçados a se defender sozinhos

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O coronavírus, ou covid-19, já subverteu os mercados financeiros globais.

O caos que o vírus está semeando na política global está apenas começando —e a política não se recupera com a mesma facilidade ou rapidez que os mercados.

Como as últimas semanas já deixaram claro, o mundo em 2020 está longe de estar preparado para apresentar uma resposta coordenada e abrangente à batalha do coronavírus.

A era da política baseada na ideia de “meu país em primeiro lugar” é também uma era de respostas “meu país em primeiro lugar” à maior crise da saúde global vista no mundo na história recente.

Em outras palavras, o coronavírus é a primeira crise real de nossa era atual de geopolítica GZero.

Compare-se a resposta do mundo ao coronavírus com o modo como o mundo enfrentou a grande crise financeira de 2008/2009.

Policial tcheco checa a temperatura de motorista entrando no país vindo da Alemanha - Christof Stache/AFP

Confrontados com um evento catastrófico, os líderes mundiais se reuniram para traçar um caminho unido, e, embora não tenham faltado dramas econômicos nas semanas e nos meses seguintes, o derretimento financeiro global completo foi evitado graças à ação pronta e coordenada ao nível dos chefes de Estado, que se reuniram sob a égide do G20 pela primeira vez para fazer frente à ameaça mundial premente.

Não é o que está acontecendo desta vez. Em meio às múltiplas batalhas geopolíticas travadas no momento —entre a China e os EUA, entre a Coreia do Sul e o Japão, entre a Turquia e a UE, para citar apenas algumas—, o mundo não vai se unir com o senso de urgência e união que esta crise exige.

E tudo isso acontece com uma economia global que já estava desacelerando não obstante os juros baixos, limitando a munição que os bancos centrais pelo mundo afora têm em mãos para combater os efeitos econômicos piores.

Uma declaração conjunta de ministros financeiros do G7 nesta semana —sem falar no corte emergencial nos juros anunciado pelo Fed americano— não conseguiu diminuir o pânico financeiro.

Em lugar de uma resposta global para fazer frente a um problema que não poderia ser mais global, os países são forçados a se defender sozinhos.

E, como sempre, os países dotados dos maiores recursos —geralmente as democracias industriais avançadas do mundo— são os que estão mais bem posicionados para resistir à tempestade.

Isso se deve em parte à sua estabilidade política geral, que garante a seus líderes o espaço político necessário para adotar políticas públicas difíceis e caras.

Mais além disso, porém, mais riqueza significa melhor acesso a infraestrutura médica e medicamentos, além de mais recursos financeiros para lidar com as perturbações e consequências econômicas; já vimos a Coreia do Sul e o Japão aprovarem orçamentos suplementares para levar em conta os custos e o caos gerados pelo coronavírus.

Os EUA aprovaram cerca de US$ 8 bilhões (R$ 38 bi) para a luta nacional contra o coronavírus.

É claro que esses são apenas os primeiros passos; se o vírus descrever o salto de epidêmico para pandêmico total, serão necessários esforços fiscais muito maiores por parte das maiores economias do mundo. Mas, novamente, esses são os países mais bem equipados para lidar com isso.

Enquanto isso, em um ambiente econômico global enfraquecido, os mercados emergentes do mundo estavam tendo dificuldades em atrair investimentos do exterior antes mesmo da chegada do coronavírus.

E, em um momento em que esses governos vão precisar de mais recursos financeiros que nunca para combater o alastramento da doença, a falta de capital disponível vai apenas agravar seus problemas.

Não está fora do âmbito do possível que o mundo veja um ou mais governos que passam por dificuldades cair graças à sua resposta (ou falta de resposta) ao surto de coronavírus.

Diante de tudo isso, prepare-se para assistir a muito mais drama político nas semanas e nos meses que vêm pela frente, na medida em que chamados justificados por cautela se misturarem com fake news infundadas e pânico generalizado.

Mas há uma boa notícia: nunca antes na história a humanidade teve o conhecimento científico que possui hoje nem os meios de divulgar esse conhecimento científico tão ampla e rapidamente. Isso será igualmente o caso quando a vacina for desenvolvida.

A resposta global talvez não seja tão unificada e eficiente quanto gostaríamos, mas milhares ou milhões de pessoas já estão correndo contra o tempo para combater o coronavírus.

Os mercados e a política passarão por um período de caos, mas o melhor que temos a fazer por enquanto é manter a calma e seguir adiante. Lavar as mãos também ajuda.

Tradução de Clara Allain 

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