Ilona Szabó de Carvalho

Presidente do Instituto Igarapé, membro do Conselho de Alto Nível sobre Multilateralismo Eficaz, do Secretário-Geral. da ONU, e mestre em estudos internacionais pela Universidade de Uppsala (Suécia)

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Ilona Szabó de Carvalho

Um ano novo de inflexão?

País tem uma janela de oportunidades para retomar a liderança global em temas e processos cruciais

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O Brasil retornou ao cenário mundial, em 2023, com a aspiração legítima de se tornar uma potência verde. Tenho reforçado em várias ocasiões que temos, nos próximos dois anos, uma janela de oportunidade para o país retomar a liderança global em temas e processos cruciais não só para os brasileiros, mas para a humanidade.

Essa janela começou neste ano na Cúpula da Amazônia, passa agora pela presidência que o Brasil acaba de assumir no G20 e vai até a COP30, a conferência global do clima que, em 2025, será em Belém. Durante esse período, essa liderança do Brasil dialoga com outros marcos internacionais. No ano que vem, acontece a Cúpula do Futuro, uma tentativa essencial e desafiadora de repactuar o multilateralismo, ou seja, a cooperação entre os países, para que seja mais inclusiva e eficaz.

Desmatamento para garimpo na terra indígena Sararé, em Mato Grosso; Brasil tem janela de oportunidade para retomar liderança em temas ambientais - Lalo de Almeida - 3.dez.23/Folhapress

Nesse contexto, alguns temas se destacam —e a agenda climática é o mais central. Acabamos de sair da COP28, em Dubai. Por mais que os resultados tenham ido além das expectativas —que, verdade seja dita, eram muito baixas— certamente não foram o suficiente para enfrentar a emergência climática que vivemos.

Mas podemos dizer que houve um ponto de inflexão, à medida que a menção a uma transição para a saída dos combustíveis fósseis entrou pela primeira vez numa resolução de cúpula do clima. Foram a pressão mundial e a aceleração incontestável das mudanças climáticas que fizeram essa COP se inclinar um pouco em cima do muro. Mas, para desejar feliz ano novo, temos de saber usar esses importantes passos.

Sem dúvida, é isso que o Brasil precisa fazer, ao trazer esse tema também como uma das agendas prioritárias do G20, que reúne as principais economias do mundo, e tem duas vias paralelas de atuação: a Trilha de Sherpas e a Trilha de Finanças. A primeira supervisiona as negociações e os pontos que formam a agenda da cúpula; a segunda é dedicada aos assuntos macroeconômicos estratégicos globais. Em novembro de 2024, antes da reunião dos chefes de Estado no Rio de Janeiro, as duas trilhas farão um encontro inédito casando as duas agendas.

Muito além do calendário, o que está em jogo é quem e como será paga a conta da transição ecológica. O financiamento sustentável para uma transição justa e, em especial, com meios e condições adequadas para países em desenvolvimento, será pauta prioritária. O Brasil traz uma atenção especial à bioeconomia e ao pagamento por serviços ecossistêmicos —vide a proposta do Floresta Tropicais para Sempre, o mecanismo de investimento e compensação para países que protegem suas florestas em pé, apresentado pelo governo em Dubai.

A outra prioridade é a reforma do sistema financeiro internacional, para que seja mais democrático, mais representativo do mundo como ele é hoje, e que os recursos sejam direcionados tanto para os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) como para a transição ecológica justa.

O G20 tem a chance de avançar na discussão iniciada na COP28 e acelerar o processo. E o Brasil está em condição única para essa corrida. Isso aumenta seu cacife internacional —e ainda mais sua responsabilidade. No ano que vem, a conferência do clima acontece de novo em um país produtor de petróleo, o Azerbaijão, e seus resultados dirão muito sobre o que teremos de entregar na COP seguinte, em Belém.

Até lá, precisamos avançar nos compromissos reais na redução de emissões de gases de efeito estufa, na transição para sistemas alimentares regenerativos e na proteção das florestas tropicais e ecossistemas biodiversos, além de cobrar melhor a sua implementação.

Que 2024 seja um ano de inflexão para o Brasil. Que o país se desapegue de economias sujas e predatórias do passado e salte de vez para o futuro verde e sustentável. Ainda dá tempo —mas se soubermos usá-lo.

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