Janio de Freitas

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Bolsonaro, Biden e alguns mentirosos mais

Frases dos presidentes insultam, debocham dos que se arriscam na defesa da Amazônia

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A indignada expectativa do mundo com o desaparecimento do indigenista Bruno Araújo Pereira e do jornalista Dom Phillips ficou à margem do breve encontro de Joe Biden e Bolsonaro, mas, ainda assim, teve a presença mais forte no falso diálogo dos dois mentirosos.

Isso se deu sob a forma de um insulto dúplice de Biden e Bolsonaro, cada qual à sua maneira, e do cinismo como sua linguagem presidencial. Se os viu por TV, por certo Putin sentiu-se abonado.

Em palco com duas poltronas afastadas estão sentados à esquerda Jair Bolsonaro e à direita Joe Biden. Ele fala gesticulando com a mão, enquanto Bolsonaro olha para baixo. Atrás de cada um deles, uma bandeira dos EUA e uma do Brasil
O presidente Jair Bolsonaro em reunião bilateral com o americano Joe Biden às margens da Cúpula das Américas, em Los Angeles, na última quinta (9) - Kevin Lamarque - 9.jun.2022/Reuters

Bolsonaro, sempre o mesmo dizendo ou desdizendo-se, foi o que é: "O Brasil preserva muito bem o seu território. Nossa legislação ambiental é bem rígida, fazemos o possível para cumpri-la, pelo bem de nosso país".

Biden, o rosto sempre contido em indefinição putiniana, conseguiu encaixar na brevidade toda a impostura: "O Brasil é um país maravilhoso, com instituições fortes. Vocês procuram proteger a Amazônia".

Essas frases insultam, debocham dos que denunciam, perdem empregos, se arriscam em luta na defesa da Amazônia. Dessa obra-prima da natureza, entregue por Bolsonaro e pelos militares bolsonaristas à sanha das milícias de garimpeiros e madeireiros ilegais, saqueando e contrabandeando riquezas em reservas indígenas e em terras da União.

Livres e impuníveis para matar, para estuprar e escravizar mulheres indígenas, para sequestrar e eliminar curumins.

Biden sabe disso mais do que a maioria dos informados: o Sivam-Sistema de Vigilância da Amazônia está entregue à Raytheon, empresa estratégica com fortes ligações ao Pentágono. Jornais e TV americanos, universidades, ONGs e variados movimentos americanos fazem mais denúncias e defesa da Amazônia do que os brasileiros.

De olho em interesses dos Estados Unidos, Biden se pôs no lado de Bolsonaro. Demonstrou-se capaz até de absorver a desaforada acusação de Bolsonaro, repetida a 24 horas do encontro, de fraudulências eleitorais na derrota de Trump.

Diferenciou-se de Bolsonaro por um pormenor: pôde olhá-lo quando falava e quando o ouvia, ao passo que Bolsonaro não pôde olhá-lo quando falava nem quando ouvia — tinha que ler, na sua leitura sofrida, o papel mal escondido entre as pernas, sobre o assento, com o que devia dizer.

Seria mais um ridículo risível, não houvesse tanto a deplorar desse encontro de mentiras, cinismo e rebaixamento moral e político do Brasil por Bolsonaro. Só Biden pôde ter um ar de riso interior.

Aqui também os seguidores de Bolsonaro cercaram de mentiras o desaparecimento de Dom e Bruno. Daí a importância da exigência, feita no Supremo pelo ministro Luís Roberto Barroso, de informações das "forças de segurança" sobre sua "ação" no caso.

Isso, depois da exigência, 24 horas antes da primeira notícia do desaparecimento, de que Polícia Federal cumpra em dez dias as medidas contra os denunciados estupros e assassinatos de yanomamis.

Natuza Nery, revelação do jornalismo político em TV, e os excelentes André Trigueiro e Marcelo Lins, desmontaram várias mentiras de militares e policiais. Como a ilegalidade dos desaparecidos ao estar sem autorização em reserva indígena.

O presidente da Funai, Marcelo Xavier, mentiu: navegavam e sumiram fora de reserva. A "ação imediata", assegurada por generais, não foi imediata e é duvidoso que se chame de ação. Nem os desaparecidos faziam "uma aventura", como dizem Bolsonaro e seguidores seus, mas trabalho de jornalista e indigenista, ambos com alta qualificação.

O polêmico jornalismo brasileiro de TV fez um avanço importante com a ênfase lúcida que os três repórteres/comentaristas ousaram. E também a GloboNews, claro.

Bruno Araújo Pereira fez entrega à Polícia Federal e ao Ministério Público de informações sobre comprometidos com assassinatos e explorações ilegais, entre eles Amarildo Oliveira e um tio seu.

Tudo sugere que a denúncia e seu autor foram informados aos denunciados. Daí surgiria um encontro deles com Dom e Phillips, ao qual o tio faltou. Uma cilada, então. Da qual Amarildo saiu em perseguição de lancha ao indigenista e ao jornalista, logo depois desaparecidos.

Vazamentos desse tipo não ocorrem sem motivação interessada. Como e quem passou a informação deveria ser investigado. É sugestivo que não o seja.

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