Jorge Abrahão

Coordenador geral do Instituto Cidades Sustentáveis, organização realizadora da Rede Nossa São Paulo e do Programa Cidades Sustentáveis.

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Jorge Abrahão
Descrição de chapéu Coronavírus

Na Europa, idade foi maior fator de risco de morte por Covid-19; no Brasil e em São Paulo é o CEP

O endereço como tradução das desigualdades estruturantes da sociedade e das cidades

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Saber qual a percepção da população na pandemia é importante tanto para a superação da crise como para medidas de enfrentamento de problemas estruturantes de nossas cidades e país. Na última semana, a Rede Nossa São Paulo e o Ibope Inteligência lançaram uma pesquisa que mostra como a população da capital paulista está percebendo e vivenciando a crise da Covid-19. Além dos dados, dela surgem reflexões que podem ser orientadoras para o futuro.

Saúde

Como não poderia deixar de ser, a saúde apareceu como ponto relevante: o investimento no Sistema Único de Saúde foi a resposta mais votada como prioridade para enfrentar a crise e 63% responderam que, sem ele, a crise seria muito pior. O SUS, que vinha sofrendo retrocessos até fevereiro, surge como elemento central para o enfrentamento da crise. No Brasil, três em cada quatro pessoas dependem do SUS e, portanto, o investimento público em saúde terá que ser prioridade. Mas como isso é possível com as atuais políticas de austeridade econômica?

Renda

Na pesquisa, duas em cada três pessoas disseram que perderam renda durante a crise e a renda básica emergencial é apontada como importante fator para a superação deste momento. A renda básica, que foi muito pouco discutida pela sociedade, ganhou relevância na crise. Se já vinha sendo cogitada como alternativa à onda de desemprego que surgirá da revolução tecnológica em curso —que combina automação e inteligência artificial— na pandemia se torna urgente e ganha visibilidade diante de um modelo econômico excludente e que mantém grande parte da população em situação de vulnerabilidade. Em um cenário pós-pandemia, com grande número de desempregados, a discussão da renda básica e o desafio de seu financiamento ganhará corpo.

Desigualdade

Cerca de 81% dos entrevistados responderam que quem mais vai sofrer com a pandemia será os que moram na periferia. A consciência das desigualdades surge de maneira muito clara. O endereço é a síntese de desigualdades acumuladas e determinantes para a expansão da Covid-19. Fatores com a renda baixa, habitações precárias, fornecimento de água intermitente e falta de acesso ao esgotamento sanitário impossibilitam a adoção da higiene e do isolamento social necessários. É possível que, em pleno século 21, cerca de 35 milhões não tenham acesso à água e 100 milhões, ao esgotamento sanitário?

Política

A pesquisa revela também uma aproximação entre a política e a sociedade quando mostra um alto índice de aprovação (70%) das decisões do Governo do Estado e da Prefeitura no enfrentamento ao coronavírus. Já o presidente da República é reprovado por uma maioria —57% julgam inadequadas suas medidas frente à crise.

É a política que está protagonizando —para o bem e para o mal— as ações na crise. A identificação com o governo estadual e municipal, rara nos últimos tempos, remete a uma valorização da política, o que é importante para o fortalecimento da democracia.

O Brasil é a nona economia do mundo e, ao mesmo tempo, uma das 10 nações mais desiguais do planeta. Habituamo-nos a viver em um país escandalosamente desigual à ponto de banalizar esta injustiça. No sistema em que vivemos, nos acostumamos às diferenças que se evidenciam em sinais exteriores de riqueza como carros, roupas ou adereços de luxo. Mas não é possível é que a desigualdade chegue ao ponto de cobrar com vidas suas vítimas. Isto é inadmissível!

Chegamos ao limite de uma sociedade que necessita urgentemente reconstruir um pacto para a superação deste que é seu maior problema. Impressionante que a grande maioria da elite econômica e política não perceba que, sem resolvermos a desigualdade crônica do país, não conseguiremos avançar minimamente como sociedade, fadados a permanecer em isolamento, hoje pela Covid-19 e depois, como sempre, pela insegurança provocada pela nossa incapacidade de construir uma sociedade menos desigual.

O Brasil é um dos países mais ricos do mundo. Existem recursos. É preciso termos a coragem de inverter as prioridades para reduzir as desigualdades e proporcionar condições de vida digna para a maioria da população. Essa é uma das lições desse momento.

E todos, sem exceção, se beneficiarão com isso!

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