Jorge Abrahão

Coordenador geral do Instituto Cidades Sustentáveis, organização realizadora da Rede Nossa São Paulo e do Programa Cidades Sustentáveis.

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Jorge Abrahão
Descrição de chapéu universidade

Paulistano está insatisfeito com sua cidade

Pesquisa traz pistas sobre o que pensa a população sobre a cidade

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Justamente no dia do seu aniversário, São Paulo recebe uma triste notícia: seis em cada dez de seus moradores dizem que, se pudessem, mudariam da cidade.

Ao longo da pesquisa "Qualidade de Vida", realizada pelo Ipec para a Rede Nossa São Paulo, surgem pistas para essa rejeição. É importante considerar que o trabalho de campo foi feito em um contexto de pós-pandemia, crise econômica e tensão política das eleições, o que de alguma maneira influencia os resultados.

A qualidade de vida na cidade

A percepção sobre a qualidade de vida está parada, sem melhora nem piora. Mas quando é analisada em conjunto com as pessoas que mudariam de cidade passa a mensagem de uma latente insatisfação da população. Depreende-se que as dificuldades percebidas são maiores do que os benefícios proporcionados pela cidade.

Engarrafamento na avenida Ruben Berta, em São Paulo - Adriano Vizoni - 20.set.22/Folhapress

A insatisfação com as lideranças políticas da cidade

A insatisfação com a administração municipal fica evidente ao se verificar que menos de um em cada dez moradores avalia a atuação da prefeitura e da Câmara Municipal como ótima ou boa, a mais baixa avaliação da série histórica da pesquisa. Fator que deve colaborar com isso é que nove em cada dez pessoas têm a percepção de pouco investimento público na região em que moram. O risco é de a insatisfação com lideranças levar à rejeição de políticos, abrindo espaço para aventureiros que trazem soluções fáceis para problemas complexos. Não podemos repetir essa história.

Vontade de participar

Mais de seis em cada dez habitantes não têm vontade de participar da vida política e a maioria acha que não há transparência nos dados da prefeitura. Se juntarmos a falta de lembrança no voto com a falta de vontade de participação social, pode-se interpretar que a população está dizendo não estar nem aí para a política, talvez por se sentir desconsiderada pelos políticos. Essa reação e a distância da vida política não contribuem para a melhoria da democracia.

Instituições que contribuem

As instituições reconhecidas como as que mais contribuem para a solução de problemas são a prefeitura, a igreja e as ONGs. Entretanto o maior número de respostas, pouco mais de um terço (35%), diz que nenhuma instituição contribui para a melhoria da qualidade de vida na cidade. Detalhe: havia 18 instituições na lista da pesquisa —incluindo empresas, governo estadual e federal, associações de bairro, universidades e sindicatos, entre outras.

Temas prioritários a serem enfrentados

A pesquisa aponta também as principais demandas da população: geração de emprego, redução das desigualdades e combate a preconceitos foram os itens mais citados, o que coincide com uma pesquisa nacional feita pelo IPEC. Há, portanto, clareza nas demandas da sociedade. A quarta demanda é pela taxação dos mais ricos, o que se alinha a políticas de impostos progressivos que vêm sendo discutidas pelo governo federal.

O fortalecimento da democracia

A pesquisa é uma foto do momento atual, mas o fato de ser feita há dez anos permite enxergá-la como um filme que, por sinal, teima em se repetir. Como um cinema que ano a ano repete o filme que passou no ano anterior, a população vem anunciando sua descrença nos políticos, sua falta de lembrança em quem votou, seu desejo de deixar a cidade, como que a pedir providências. O movimento percebido é de distanciamento, mas é difícil dizer se é também de desinteresse.

Pesquisa do Ipec sobre como paulistanos veem sua cidade
Pesquisa do Ipec sobre como os paulistanos veem sua cidade - Reprodução

O alento vem do fato de que todas as demandas da população estão em sintonia com políticas anunciadas pelo governo federal (geração de emprego e combate às desigualdades e a preconceitos), o que pode significar a obtenção de apoio a programas e projetos que avançam nessa direção. O alinhamento dos poderes local, estadual e federal é uma das chaves para resolver problemas em cidades grandes.

Na vida real, os políticos não estão resolvendo os problemas. E a resposta da população ao aumento da fome, da pobreza, do desemprego e da insegurança alimentar é o desdém com os políticos. O risco é a democracia não ser identificada como um regime que promove qualidade de vida. Cabe aos políticos, portanto, assumir a responsabilidade das transformações. Para tanto, é preciso coragem para enfrentar temas que são óbvios, mas que se tornaram tabus graças a uma narrativa tosca, porém muito bem construída.

A pesquisa dá pistas. A população diz o que deseja e aponta o caminho: ao dizer que quer reduzir as desigualdades, diz que os recursos devem vir dos mais ricos.

Escutar a população pode ser o atalho para valorizarmos a política e a democracia, o caminho mais curto para uma sociedade mais justa, menos desigual e que permita uma vida digna para a maioria das pessoas. É possível: cabe à sociedade pressionar e aos políticos fazer acontecer.

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