Jorge Abrahão

Coordenador geral do Instituto Cidades Sustentáveis, organização realizadora da Rede Nossa São Paulo e do Programa Cidades Sustentáveis.

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Os desafios das mulheres que começam em casa e se consolidam na política

Somados à dupla/tripla jornada, há a desigualdade de gênero e o assédio, em todos os ambientes

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Todos os anos fazemos pesquisas sobre as mulheres e a cidade para monitorar o avanço ou o retrocesso nesse tema relevante.

Há mudanças? Há! Mas numa escala e velocidade tão menores do que é necessário que, não raro, temos que lutar contra o desânimo. Como mudar? Os processos são lentos, mas reside nos programas e políticas públicas o caminho mais eficiente para a universalização de mudanças.

E elas, as políticas, têm acontecido? Sim, mas os mecanismos de dissuasão e as malandragens têm sido mais eficientes. O ditado do crime que compensa muitas vezes se materializa nesses casos. Com isso levamos mais tempo —ou perdemos mais tempo— para transformações inexoráveis. Por exemplo: os partidos políticos são obrigados a ter 30% de candidatas mulheres e investir a mesma proporção do fundo partidário em candidatas. Na última eleição, várias artimanhas foram constatadas para burlar a regra, com candidaturas laranja para, na realidade, canalizar recursos para o partido e candidaturas masculinas.

Resultado das eleições municipais de 2020: em números redondos, dos 56 mil vereadores eleitos, somente 9.000 (16%) são mulheres e 47 mil (84%), homens. A sub-representação das mulheres atrasa a definição de políticas que promovem equidade de gênero.

Na pesquisa do Instituto Cidades Sustentáveis/Rede Nossa São Paulo, realizada pelo Ipec na cidade de São Paulo, duas em cada três mulheres declaram ter sofrido algum tipo de assédio: gestos, olhares incômodos e comentários invasivos. O lugar onde mais ocorrem é no transporte coletivo, seguido do ambiente de trabalho. O fato de sabermos que há assédio e onde ocorre contribui para a construção de soluções. A partir daí é questão de conscientização e decisão política.

Os registros de violência contra mulheres aumentaram 700% de 2016 para 2023. Eram 1.276 casos e, agora, são 9.150. Os números não garantem que os casos aumentaram porque podem indicar a enorme subnotificação de um passado regido pelo medo e que, paulatinamente, se altera devido ao encorajamento proporcionado pelo ganho de consciência.

Quando a pergunta é como enfrentar a violência, quase a metade responde: aumentar a punição. Em seguida vêm as medidas protetivas e as campanhas de comunicação. Idealmente, os políticos deveriam criar políticas para causas comuns e de interesse público, pois representam a população como um todo.

Mas uma maior representação feminina na Câmara de Vereadores ajudaria muito nessas mudanças. Hoje, a câmara de São Paulo tem 23% de mulheres. Das capitais, Porto Alegre é a que apresenta o maior percentual de vereadoras, 30%, e Campo Grande, o menor (3%).

No mundo da política, as mulheres estão sub-representadas, lembrando que são 51,5% da população brasileira. No governo Bolsonaro, eram 13% do ministério e, no atual governo Lula, 29%. Na alta liderança do poder público, elas são 34%.

No mundo empresarial não é diferente —as mulheres também são sub-representadas: 38% ocupam cargos de liderança, sendo que somente 6% são mulheres negras e 17% são CEOs. No que diz respeito a salários, elas recebem 22% a menos do que homens na mesma função.

A divisão de tarefas domésticas segue desigual. Quatro em cada dez lares de São Paulo têm mulheres como totalmente responsáveis pela maior parte dos afazeres: limpar a casa, preparar refeições e lavar a louça são as tarefas mais citadas. Aos homens cabe a manutenção da casa e tirar o lixo. A diferença de percepção sobre a divisão de tarefas merece registro: para 32% das mulheres, os serviços são divididos igualmente, mas entre os homens esse percentual sobe para 50%. Aparece aqui o machismo ainda latente de nossa sociedade.

Dados da União Interparlamentar mostram que o Brasil ocupa a posição 143 entre 188 países no que diz respeito à quantidade de deputadas no parlamento nacional (18%), o que dá a medida do quão atrasados estamos se comparados a outros países.

Em 2024 temos eleições municipais, momento de olhar as propostas de candidatas e candidatos. Temos hoje 658 prefeitas (12%) nas 5.570 cidades brasileiras. Diante dessa desigualdade, saber o que propõem para reduzir a violência e o assédio, aumentar as oportunidades para as mulheres e avançar na equidade de gênero nas cidades pode ser, sim, parâmetro para a definição do voto.

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