Juca Kfouri

Jornalista, autor de “Confesso que Perdi”. É formado em ciências sociais pela USP.

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Juca Kfouri

Junho de 2013, o futebol e o Brasil

Faz dez anos que o país sediou a Copa da Confederações e pediu padrão Fifa

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Impossível dissociar as famosas, e jamais digeridas, manifestações de junho de 2013, da realização da Copa das Confederações em Belo Horizonte, Brasília, Fortaleza, Rio de Janeiro, Recife e Salvador.

Nos gramados, a seleção brasileira ganhou ao derrotar, com facilidade, os então campeões mundiais espanhóis, vitória capaz de produzir tamanho autoengano que originou outro, o surreal 7 a 1 nas semifinais da Copa do Mundo propriamente dita.

Brasileiros comemoram a conquista da Copa das Confederações, no Maracanã - Adriano Vizoni - 30.jun.13/Folhapress

O que havia começado em São Paulo, aparentemente apenas em torno de protestos estudantis por causa de 20 centavos de aumento na passagem de ônibus, tomou conta do Brasil revoltado pela violência da PM paulista ao reprimir o ato.

Cartaz colado em ônibus no centro de São Paulo em 2013 - J. Duran Machfee - 21.jun.13/Futura Press/Folhapress

Sem lideranças conhecidas ou assumidas, sem norte político e contra a política, o padrão Fifa visto nos suntuosos estádios erguidos pelo país afora passou a ser exigido onde mais é necessário —nas escolas, hospitais, transportes públicos e na segurança.

Foi um fuzuê danado.

Policiais na avenida Paulista para conter manifestantes, no início de 2014 - Fabio Braga/Folhapress

No dia 19, a seleção do Brasil enfrentou a do México, no Castelão, e, no caminho do estádio, o ônibus da Fifa, que levava jornalistas, acabou cercado por uns 200 manifestantes, que não arredavam pé da intenção de impedir que seguíssemos.

Um brasileiro, eu, e cinco estrangeiros assustados que só eles.

Bateu-me então o espírito de jerico que meu pai costumava carimbar em minha pobre pessoa quando criança e, aos 63 anos, avisei a policial cearense que, na porta do ônibus fechado, fazia o papel de segurança: "Abre aí, por favor, que vou explicar para eles que somos todos jornalistas, que não tem cartola aqui dentro", apelei certo de que seria reconhecido e atendido.

"Não vou abrir não. Se o senhor descer vão é lhe encher de pórrada", respondeu a jovem muito mais sábia e prudente, com a deliciosa música da fala cearense e sotaque: pórrada!

Chegamos com atraso, mas a ponto de ver a vitória nacional por 2 a 0.

No começo da noite seguinte, no aeroporto de Fortaleza, a caminho de Salvador, as telas de TV, sem som, mostravam a invasão no prédio do Itamaraty, em Brasília.

Ao ver aquilo, perplexo, decidi não embarcar, por achar que não poderia ficar duas horas voando sem saber o que acontecia em terra.

E tive a angustiante certeza de que não havia um brasileiro que pudesse aparecer naquelas telas, pedir calma e ser ouvido.

Constatava uma terrível crise de representatividade.

Lula era também alvo das reivindicações, Dilma estava no olho do furacão, Chico Buarque tinha descoberto pelas redes antissociais que muita gente o tinha na conta de um bom fdp e dom Paulo Evaristo Arns estava adoentado, recolhido, inerte.

No caminho de volta ao centro da capital cearense, atendo ligação de alto cartola da Fifa. Ele diz que o hotel onde estava hospedado, com bandeira da entidade, havia sido apedrejado, dois ônibus depredados e quis saber minha opinião sobre o que aconteceria se a Copa das Confederações fosse suspensa.

Respondi que não fazia a menor ideia e ele pediu que eu não publicasse nada, o que, é claro, não foi possível.

Notícia dada, devidamente desmentida pela cúpula da Fifa, um ano depois, em entrevista a um repórter da ESPN Brasil, o famigerado secretário-geral Jérôme Valcke, candidamente, contou que o torneio esteve mesmo por um fio de ser cancelado.

Melhor seria ter sido, assim como a própria Copa do Mundo…

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