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Os conflitos em Apure e a responsabilidade internacional do regime venezuelano

Confrontos na região exigem uma atenção coordenada de todos os países vizinhos

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Nastassja Rojas

Professora da Pontifícia Universidade Javeriana (Colômbia). É pesquisadora sênior da Food Monito e especialista em movimentos migratórios, estudos de gênero e política venezuelana.

Na madrugada de domingo, 21 de março, os moradores de La Victoria, um município venezuelano do estado de Apure, localizado na fronteira com o departamento colombiano de Arauca, começaram a relatar nas redes sociais explosões, tiros e a presença de helicópteros na área.

Após horas de confrontos, o Ministro da Defesa anunciou em sua conta no Twitter que as Forças Armadas Nacionais Bolivarianas da Venezuela (FANB) estavam atuando em defesa da nação.

Durante os primeiros dias dos confrontos, as informações eram limitadas. Dias depois, o ministro das Relações Exteriores do regime bolivariano, Jorge Arreaza, declarou que se tratava de um ataque à soberania do país por grupos armados irregulares protegidos pelo Governo da Colômbia.

Soldados venezuelanos patrulham de barco trecho do rio Arauca, na fronteira entre Venezuela e Colômbia
Soldados venezuelanos patrulham de barco trecho do rio Arauca, na fronteira entre Venezuela e Colômbia - Luisa Gonzalez - 28.mar.21/Reuters

E, finalmente, os atacantes foram identificados como grupos terroristas colombianos. Entretanto, desde as primeiras horas presumiu-se que se tratava de um confronto entre as forças do Estado e um grupo dissidente das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia).

A verdade é que nesta área de fronteira existem diferentes grupos armados e do crime organizado que competem pelo território e controle do tráfico de drogas. Diferentes grupos dissidentes das Farc se encontram em território venezuelano há algum tempo com a aprovação do regime.

Neste contexto, diz-se que os confrontos são o resultado de diferenças entre os acordos locais entre a Décima Frente e os membros do exército venezuelano na região e os acordos entre o regime de Maduro e a Segunda Marquetalia, o grupo dissidente das Farc liderado por Ivan Marquez.

Também estão envolvidos nesta luta pelo controle do tráfico de drogas os membros das Forças Armadas Nacionais Bolivarianas e as temidas Forças de Ação Especial.

Os 2.200 quilômetros de fronteira que separam os dois países estão acostumados ao conflito, mas a região fronteiriça compartilhada por Arauca, na Colômbia, e Apure, na Venezuela, não costuma fazer manchetes. Por isso, o recente conflito, marcado pelo sigilo e pelas informações contraditórias divulgadas pelo regime venezuelano e a magnitude das consequências humanitárias, é, portanto, particularmente preocupante.

Detenções arbitrárias, execuções extrajudiciais, destruição de casas e medo das forças do Estado causaram, nos primeiros dias, o deslocamento de mais de 3.000 refugiados para Arauquita, do outro lado da fronteira.

E enquanto a luta diminuiu, o último relatório do Grupo Interagencial sobre Grupos Mistos Migratórios afirma que os refugiados continuam chegando. Até o momento, mais de 5.000 pessoas foram deslocadas, incluindo menores e mulheres grávidas.

Apesar dos esforços do governo colombiano e particularmente da Administração de Fronteiras colombiana, juntamente com vários parceiros de agências internacionais para ajudar esta população e garantir seu retorno em segurança, os ataques do regime não cessam.

Da Venezuela, o prefeito de La Victoria acusa o governo colombiano de impedir o retorno dos venezuelanos. Esta encruzilhada está ocorrendo em meio à crise da pandemia em que alguns abrigos estão estabelecendo cercas epidemiológicas para conter surtos de contágio.

Neste contexto, o regime venezuelano aponta diretamente para Iván Duque como responsável pelo conflito com o apoio do governo dos Estados Unidos, e ameaçou levar a Colômbia a organismos internacionais pela suposta agressão. Entretanto, além dos argumentos apresentados pelo regime de Maduro, estes não justificam a violação dos Direitos Humanos.

A responsabilidade pelas execuções extrajudiciais de mais de 18 mil civis que se apresentaram como membros de grupos armados ou gangues criminosas em áreas urbanas nos últimos sete anos; a violação da integridade pessoal; a ausência de garantias de assistência humanitária; o retorno seguro; e o deslocamento forçado de mais de 5.000 pessoas na fronteira Apure-Arauca, cabe exclusivamente ao Estado venezuelano.

O regime argumenta que não tem obrigação de responder ao Sistema Interamericano, dada sua suposta saída da OEA. Entretanto, além de seu status perante a organização, a proteção dos Direitos Humanos não está sujeita ao reconhecimento em um tratado. E embora seja claro que a ratificação dos instrumentos não garanta a proteção efetiva dos Direitos Humanos, eles geram responsabilidade internacional, independentemente de quem detém o poder.

A obrigação de proteger a população também deriva do Sistema Universal de Proteção dos Direitos Humanos e do que está consagrado em seus instrumentos, que foram assinados e ratificados pela Venezuela. Especialmente aqueles estabelecidos no que é conhecido como a Carta Internacional dos Direitos Humanos.

Finalmente, é preciso lembrar que existe também uma responsabilidade compartilhada da comunidade internacional de apoiar a Colômbia institucional e economicamente na atenção da crise migratória e agora na atenção dos refugiados no município de Arauquita.

O endurecimento das políticas migratórias em alguns países da região, longe de oferecer soluções, gera um fardo maior para a Colômbia diante de uma crise que infelizmente parece estar longe de chegar ao fim. Os confrontos na região fronteiriça Apure-Arauca exigem uma atenção coordenada de todos os países vizinhos.

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