Laura Carvalho

Professora da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, autora de "Valsa Brasileira: do Boom ao Caos Econômico".

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Laura Carvalho

Alta de juros nos EUA pode reverter queda da Selic

Novo choque externo vai pôr fim ao real valorizado e à inflação e ao juro baixo

Operadores na Bolsa de Valores de NY nesta quarta (7)
Operadores na Bolsa de Valores de NY nesta quarta (7) - Brendan Mcdermid/Reuters

Na segunda-feira (5), os dados positivos do mercado de trabalho dos Estados Unidos e a expectativa de aumento na taxa de juros pelo banco central americano desencadearam forte desvalorização nas Bolsas de Valores ao redor do mundo, levantando temores de um novo caos financeiro global.

Embora essas perdas tenham sido, por ora, revertidas, o episódio deixou claro que o fim iminente do ciclo de liquidez internacional iniciado no pós-crise de 2008 encerrará o boom nos preços de ativos financeiros e imobiliários da última década, com consequências para a economia real mundo afora.

As repercussões no Brasil não são muito difíceis de prever. Em maio de 2013, com a perspectiva de retomada da economia americana, o Federal Reserve começou a anunciar que o seu programa de expansão monetária seria eliminado gradualmente a partir de junho e julho daquele ano.

O anúncio afetou as expectativas dos investidores, que passaram a esperar uma elevação da taxa de juros nos Estados Unidos, provocando enorme volatilidade nos fluxos de capitais para países emergentes.

A saída de capitais desses países, por sua vez, gerou uma desvalorização rápida de suas moedas, além de queda no preço de ações e aumento dos juros cobrados sobre a dívida pública. Grande receptor de capitais especulativos de curto prazo, o Brasil ficou entre os que mais sofreram os efeitos dessa reversão.

Diante da aceleração da inflação e da fuga de capitais, que desvalorizaram muito o real em relação ao dólar, a taxa Selic acabou sendo elevada de 7,25% ao ano, em março de 2013, para 11,75%, em dezembro de 2014, em termos nominais.

A taxa de juros real "ex-post", que desconta da Selic anunciada pelo Banco Central a inflação acumulada em 12 meses, subiu de 0,7% em março de 2013 para 5,3% em dezembro de 2014.

Pode-se dizer que o episódio das "taper talks" —como ficou conhecido o anúncio da nova fase do QE ("quantitative  easing")— acabou de vez com o sonho de redução permanente da taxa de juros que mobilizou o governo de Dilma Rousseff em seus primeiros anos.

Estudiosos do tema defendem que a introdução de controles simétricos sobre os fluxos especulativos de capitais durante a fase de alta liquidez internacional poderia ter preparado melhor o país para enfrentar o choque.

Em particular, se, em vez de introduzir o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) apenas sobre posições vendidas no mercado de derivativos de câmbio (apostas na queda do dólar relativamente ao real), como fez em 2011, o governo brasileiro tivesse introduzido também um IOF sobre posições compradas (apostas na queda do real relativamente ao dólar), essa reversão brusca poderia ter sido amenizada.

Na coluna de 28/12/2017, defendi a introdução de tais controles para evitar que a provável elevação da taxa de juros nos EUA levasse a uma saída em manada de capitais especulativos ainda em 2018.

Tendo o governo perdido mais uma oportunidade para fazê-lo, um novo choque externo será suficiente para pôr fim às hoje tão celebradas valorização do real, inflação no piso e queda na Selic.

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