Leandro Narloch

Leandro Narloch é jornalista e autor do Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil, entre outros.

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Ideia revolucionária fundou o mundo moderno

Livro retrata meritocracia como inovação iluminista que pôs fim às sociedades aristocráticas

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Um mês depois da Tomada da Bastilha, em 1789, a Assembleia Nacional da França aprovou um dos textos mais importantes da história do mundo –a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.

Um trecho consagrava uma ideia nova para a época, uma das bandeiras dos iluministas franceses: as pessoas devem ser julgadas por seu mérito, e não pela raça, sexo ou pela “nobreza do sangue”.

“Todos os cidadãos são iguais a seus olhos e igualmente admissíveis a todas as dignidades, lugares e empregos públicos”, diz o sexto artigo da declaração, “segundo a sua capacidade e sem outra distinção que não seja a das suas virtudes e dos seus talentos”.

De tão usado, o termo “revolucionário” anda um pouco batido –tudo hoje é revolucionário. Mas a palavra se aplica perfeitamente à meritocracia.

Até o Iluminismo, conta Adrian Wooldridge num livro brilhante que acabou de sair, “The Aristocracy of Talent”, a seleção para cargos no Exército e na administração pública tinha como critérios a origem ou o sobrenome.

Vigorava a crença de que havia uma ordem social fixa, que era preciso aceitar a posição que Deus reservou a cada um. Considerava-se o alpinismo social uma ofensa à ordem natural. Depois da ascensão da meritocracia, os pobres e os discriminados enfim conquistaram o direito de competir.

Nas sociedades tradicionais aristocráticas, diz o autor, as pessoas eram julgadas por sua identidade coletiva, por conexões e relações familiares. O tráfico de influência era a essência da vida social.

Já na sociedade meritocrática, é feio usar amizades para obter vantagens. Vir de baixo é motivo de orgulho; as pessoas são antes de tudo indivíduos “donos de seu destino e capitães de sua alma”.

Não à toa, conservadores foram os primeiros a criticar o mérito como critério de seleção –crítica que povoa a esquerda. Intelectuais conservadores reagiram à moda de escolher oficiais por meio de testes intelectuais e advertiram que isso causaria “desarmonia entre as classes”.

Editor de política e colunista da revista The Economist, Wooldridge acredita a meritocracia é o mais perto que temos de uma ideologia total, na qual todos acreditam, mesmo seus críticos.

Por exemplo, a luta das feministas ou dos transgêneros contra a discriminação no mercado de trabalho é fundada na ideia de que as pessoas devem ser julgadas por suas capacidades.

Martin Luther King fez uma célebre defesa da meritocracia quando disse sonhar “que um dia meus quatro filhos vivam em uma nação onde não sejam julgados pela cor de sua pele, mas pelo seu caráter”.

A própria ideia de que devemos prover educação e oportunidade aos pobres é baseada no mérito. Num mundo onde o critério de seleção é alguma identidade coletiva ou a cor da pele, e não capacidades intelectuais, há menos incentivo para se investir em educação.

“The Aristocracy of Talent” é uma espécie de resposta ao livro “A Tirania do Mérito”, que Michael Sandell lançou no ano passado.

Wooldridge é generoso com quem discorda –reconhece que o estado atual da meritocracia tem falhas e as descreve em detalhes. Mas não vê alternativa melhor (e moralmente mais correta) para se organizar a sociedade. Acredita que os problemas do sistema se resolvem com mais –e melhor– meritocracia.

No Brasil, temos uma questão adicional. A escola pública agrava a desigualdade de nascimento que mina a meritocracia.

A criança já nasce pobre, muitas vezes com pais ausentes ou negligentes, e nós ainda a mandamos para escolas de onde ela sairá sem saber uma simples regra de três.

A educação pública –e os sindicatos de professores que impedem inovações no setor, como a destinação de verbas do Fundeb para “charter schools”– agravam as falhas da meritocracia brasileira.

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