Lúcia Guimarães

É jornalista e vive em Nova York desde 1985. Foi correspondente da TV Globo, da TV Cultura e do canal GNT, além de colunista dos jornais O Estado de S. Paulo e O Globo.

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Lúcia Guimarães

Extremismo nos Estados Unidos cria nova geração de 'migrantes'

Professores, bibliotecários e políticos deixam funções para não lidar com paranoias neopentecostais e normalização da mentira

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Quem precisa de médicos, cientistas e acadêmicos? Que sistema de educação pública funciona sem professores dedicados e com independência didática? Uma minoria hoje no poder nos Estados Unidos parece disposta a pagar para ver.

Apoiadores do ex-presidente dos EUA Donald Trump em protesto em frente à sede do Legislativo do estado de Michigan, em Lansing, para demandar recontagem dos votos das eleições de 2020, que o republicano afirma que foram roubadas - Rebecca Cook - 12.out.21/Reuters

A polarização política nos EUA não foi inventada por Donald Trump. Sua versão mais recente tem origem no comportamento do Partido Republicano durante a Presidência de Bill Clinton, nos anos 1990.

Mas a veia trumpista da ultradireita, longe de perder fôlego após a tentativa de golpe em 6 de janeiro de 2021, está impulsionando consequências de longo prazo na federação americana. Nos últimos anos, há sinais de uma onda migratória interna e uma fuga de cérebros dos estados cujos Legislativos adotaram leis extremas demais para a maioria do eleitorado.

Professores da rede pública —e falta professor neste país– estão se aposentando mais cedo porque a mal remunerada profissão hoje, em certos estados, requer enfrentar pais fanáticos neopentecostais que querem censurar currículos e são generosamente financiados pelos mesmos grupos de interesse que aparelham o Judiciário com magistrados ultraconservadores.

Uma atividade antes pacata, a dos bibliotecários, hoje requer um grau de paranoia, já que campanhas para banir livros clássicos fazem dos profissionais alvos favoritos de demagogos como o beócio Ron DeSantis, o governador da Flórida cuja pré-campanha à Presidência nem o salto alto que ele esconde nas suas botas consegue elevar.

O número de inscrições para residências médicas em obstetrícia, uma especialidade que já enfrentava escassez de médicos, caiu mais de 10% nos estados que voltaram a criminalizar o aborto, apoiados na decisão da Suprema Corte, em junho de 2022. É cedo para examinar as consequências demográficas e econômicas daquela decisão, mas sabe-se que clínicas de medicina reprodutiva de estados vizinhos mal dão conta do influxo de pacientes. Um terço dos municípios americanos não tem clínicas de assistência à maternidade, num sinal de que a direita cristã prefere proteger fetos a crianças nascidas.

Uma pesquisa recente, entre docentes universitários de estados como Flórida, Geórgia, Carolina do Norte e Texas, de maioria republicana, revelou que dois terços recomendam a colegas evitar fazer pesquisas acadêmicas nestes estados e pelo menos um terço procura ativamente emprego em outros estados.

Donald Trump foi eleito, em parte, graças à fuga de profissionais de estados com vastas áreas rurais e enfrentando declínio pós-industrial. Nesta semana, o novo presidente da Câmara, um homem que considera o aborto o "Holocausto americano", lamentou que o Partido Republicano não consiga atrair mais eleitores com educação superior. Mike Johnson, da Louisiana, colocou a culpa nos democratas que, segundo ele, controlam a academia e se especializam em lavagem cerebral.

Um número crescente de deputados e senadores vai jogar a toalha e desistir de disputar a reeleição. Dos 37 que já decidiram não concorrer, a maioria é democrata, mas a motivação parece suprapartidária. O deputado republicano Ken Buck explicou por que quer voltar para casa no Colorado. Está cheio da normalização da mentira no Congresso e de fazer papel de vilão quando contesta colegas de bancada que descrevem o 6 de janeiro de 2021 como uma visita turística ao Capitólio.

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