É editora de 'Mundo' e foi correspondente em Nova York, Genebra e Washington. Escreve às sextas sobre séries de TV.
Mais ardilosa e realista, 'House of Cards' volta com Frank sob pressão
Frank Underwood conseguiu o que queria. Chegar ao poder, porém, é mais fácil do que se manter nele, e isso o protagonista escroque do drama político "House of Cards" aprenderá a contragosto na terceira temporada da série, que o Netflix colocou inteira no ar nesta sexta (27).
Azar de Frank (Kevin Spacey, já consagrado por este trabalho), sorte do espectador. Ao mostrar a vulnerabilidade do personagem, até então um anti-herói ambicioso e invencível, o enredo expõe as origens shakespereanas e ganha em profundidade, sutileza e verossimilhança.
A nova temporada começa com Frank onde ele sempre quis estar, na Casa Branca, acompanhado da cúmplice Claire (a espetacular Robin Wright). Ao contrário do que esperava, ele não é um presidente amado -seus índices de popularidade são deploráveis- e muito menos temido -seus adversários o tratam como mero tapa-buraco.
A pressão vem de todos os lados: da oposição republicana; do próprio partido Democrata; da Rússia (com direito a participação da banda de protesto Pussy Riot); de uma primeira-dama cujas ambições ainda não foram saciadas; de ex-aliados e até de sua consciência (sim, há uma) e de uma suposta força divina. Ninguém tem fé em Frank.
Em uma lista de melhores séries sobre Washington feita pela revista política "Foreign Affairs", "House of Cards" ocupou o terceiro lugar, mas recebeu nota cinco no quesito precisão, atrás da comédia "Veep".
Esse presidente acuado que protagoniza a nova temporada, assombrado por um Congresso arredio que de tempos em tempos torna o país ingovernável e pelo decorrente temor de não deixar legado nenhum, aproxima a ficção da realidade (esforço selado pela participação de estrelas do jornalismo americano).
Um Frank apequenado também dá chance para que outros cresçam. Claire, que roubava parte das cenas, se mostra a personagem mais imprevisível, seduzindo, manipulando e, quem diria, perdendo o controle.
Uma nova rival torna a sobrevivência dos Underwood muito mais incerta. Até as novas repórteres fictícias, Ayla (Mozhan Marnò) e Kate (Kim Dickens, a policial de "Garota Exemplar"), redimem a profissão da deplorável Zoe (Kate Mara, atriz ruim para personagem péssima).
Mas é Doug (Michael Kelly), o leal chefe de gabinete e capanga-mor de Frank, a melhor das surpresas.
Amargurado pelas limitações físicas e psicológicas trazidas pelos incidentes da última temporada, Doug é um caldo de ressentimento que esquenta aos poucos, alimentado pela falta de apreço do ex-patrão, por seu talento para atividades políticas escusas e pela obsessão pela prostituta Rachel (Rachel Posner), além de algum álcool.
Se explodir (a Folha só teve acesso antecipado aos seis primeiros episódios até a conclusão desta coluna), Frank Underwood pode se ver diante do medo maior de qualquer político: ser ofuscado.
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