A maior surpresa da segunda temporada de "Criminal - Reino Unido", que estreou em setembro na Netflix, é que Kit Harington, o insosso Jon Snow de "Game of Thrones", sabe atuar (e bem). Há outras nos quatro episódios desta nova leva.
Diferentemente da primeira, em que os crimes e motivações investigados pela equipe da delegada Hobbs, papel de Katherine Kelly, variavam, desta vez três das quatro histórias partem dos mesmos elementos: sexo, amor, consentimento e violência (a última, cujo crime em questão é assassinato, passeia por outros níveis de sociopatia).
Não são eles, no entanto, que dão o que pensar. A sacada aqui é conduzir a narrativa pela forma como a sociedade percebe e reage a esses comportamentos, tão relevante quanto os eventuais crimes.
O melhor episódio de todos é o que Harington estrela, uma intrincada narrativa sobre abuso sexual. Alex, seu personagem, é um jovem executivo em ascensão no mercado financeiro acusado de ter estuprado uma colega .
Como na temporada anterior, tudo se passa apenas na delegacia, durante os interrogatórios feitos pela equipe de Hobbs. O espectador jamais vê o crime e, como os investigadores, precisa tirar conclusões a partir do depoimento do personagem-chave.
É um jeito inteligente de envolver a plateia, deixando que ela imagine o que passou até que haja pistas suficientes para um desfecho, não necessariamente conclusivo.
Acaba por servir de espelho, para nós mesmos, de nosso repertório de valores, vivências e percepções sociais. Conforme nos deixamos guiar por esse conjunto, por exemplo, acharemos Alex culpado ou inocente, arrogante ou imbecil, pérfido ou manipulável.
O mesmo acontece nos demais episódios, e talvez o que mais nos faça repensar os conceitos de correto e justo seja o terceiro, estrelado pela genial Sharon Horgan (da excelente comédia "Catástrofe"). Ela é uma mulher que denuncia pedófilos movida por um senso de propósito e de justiça ofuscantes (dizer mais que isso será spoiler).
A quadra de atores convidados, maior trunfo de "Criminal", é completada por Sophie Okonedo (indicada ao Oscar por "Hotel Ruanda", aqui na pele da mulher de um homem preso por assassinar um amante) e pelo indiano Kunal Nayyar. O Raj de "Big Bang Theory" vive um empreendedor condenado por um assassinato que se oferece para depor sobre outro crime.
A vida dos investigadores aparece de relance em diálogos, criando um mínimo de continuidade entre os episódios do ano passado e os novos.
A primeira temporada da série, criada por George Kay (roteirista de "The Hour") e Jim Field Smith, de "Episodes", tinha também capítulos na Alemanha, França e Espanha, todos ambientados no mesmo cenário de delegacia. Por ora, estes não ganharam, continuidade. Poderiam. É um dos thrillers mais inteligentes da leva recente. Que tal um "Criminal - Brasil", Netflix? 'Criminal - Reino Unido' está na Netflix
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