Enumere as qualidades de pessoas que exercem poder de fato. Fiel aos acontecimentos históricos, em sua lista não constarão sofisticação intelectual, cultura e muito menos um currículo que prova competência.
Ao invés disso, carisma, charme, capacidade de inspirar e persuadir, tolerância a riscos, autoconfiança e aspirar ousadamente. Elementos assentados em um espectro que passa por honra, orgulho, arrogância e narcisismo.
Todas estas qualidades montam uma necessária e inabalável capacidade em se exultar. E uma forte crença na importância de suas missões. Pontos muito necessários para superar os ataques de oponentes e as traições, tão comuns nas intensas disputas pelo poder. Portanto, não é surpreendente que esta competição selecione os arrogantes.
Vencer uma eleição é um feito grandioso. E quando uma vitória deste porte é conquistada, provavelmente outras surgirão. Conquistas sucessivas aumentam a arrogância do bem-sucedido. Mas fatalmente, alguma crise virá. E alguns líderes, paradoxalmente, respondem às tensões com mais arrogância, disfuncional. A partir de então emergirá a insistência em erros, guiada pela incapacidade de rever decisões e mudar julgamentos.
Alguns consideram ser uma doença, este degenerado comportamento arrogante. Jonathan Davidson e David Owen, em 2009, descreveram clinicamente esta afecção, “a síndrome da arrogância”. Caracterizando-a como distúrbio de alguns que conquistaram e detiveram muito poder. Esta condição psiquiátrica explicaria certas atitudes de líderes, como a impetuosidade, impulsividade imprudência e a falta de atenção a detalhes inconvenientes.
Seriam outros sintomas desta síndrome a busca pela glória, a preocupação exagerada com aparência, o uso de trejeitos messiânicos, o discurso exaltado e imperativo, o desprezo por críticas e por conselhos.
Muitos destes sintomas se confundem com as manifestações causadas pelo transtorno da personalidade narcisista, mas para padecer da síndrome da arrogância pressupõe-se o poder. Pois quem a possui, necessariamente assume que a vontade própria é a da nação. E também, que julgamentos mundanos não o alcançam. Logo, contas serão prestadas apenas a Deus ou a história.
Há a consciência de que estes elevados tribunais lhe serão muito favoráveis. Além disso, uma moral rígida costuma orientar suas atitudes, o que faz desconsiderar os melhores resultados e a praticidade. E por fim desprezam os cerimoniais do poder. Mas esta moléstia ocupacional não se restringe a políticos. Pode afetar os raros detentores de grande força, como altos executivos, artistas e gurus religiosos.
Porém se existe uma doença, deve haver uma explicação orgânica para sua existência. Para a síndrome da arrogância, temos apenas uma teoria a respeito. O neurotransmissor dopamina fortalece as conexões cerebrais codificadas após uma nova e forte motivação. Estas conexões revigoradas, operam para a repetição de um comportamento, em cérebros susceptíveis. Presume-se que deve haver predisposição, que estaria atrelada ao lobo frontal. O lobo cerebral do raciocínio e do discernimento. Fenômenos semelhantes estão dentro de cérebros de viciados.
Uma das possíveis consequências da síndrome da arrogância foi bem exemplificada por Erich Remarque, veterano da Primeira Guerra Mundial e autor do livro "Nada de novo no Front". Nesta obra, existe uma passagem em que os personagens percebem que o destino dos milhares que padecem pelo horror do conflito está na mão de cinco ou seis líderes. Poderosos com a síndrome da arrogância se isolam e passam a crer em uma realidade paralela, que permite o senso de seu raciocínio. E frequentemente são cercados de bajuladores. Desta forma insistem em conflitos, ou tensões que só disseminam sofrimento.
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