Luís Francisco Carvalho Filho

Advogado criminal, é autor de "Newton" e "Nada mais foi dito nem perguntado"

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Descrição de chapéu Coronavírus

Tribunal Internacional da Pandemia

Jair Bolsonaro age com a desfaçatez dos homicidas eventuais

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Em um planeta justo e igualitário no plano político, econômico e jurídico, a ONU (Organização das Nações Unidas) teria poder para instalar, ad hoc, o Tribunal Internacional da Pandemia (TIP).

O Tribunal de Nuremberg (1945) foi criado para a reparação punitiva do genocídio nazista. São as atrocidades que explicam os Tribunais Penais Internacionais para a antiga Iugoslávia (TPII, 1993)
e para Ruanda (TPIR, 1994).

Do ponto de vista humanitário, justifica-se o julgamento criminal de autoridades que, por ação ou omissão, deram causa à morte desnecessária de milhares de pessoas, em diferentes países, pelo coronavírus, como sugere Reinaldo Azevedo.

O TIP não se moveria pelo sofrimento das vítimas. Nem estaria interessado em identificar culpados pela pobreza ou pela fragilidade dos sistemas hospitalares, preexistentes à doença.

É possível estimar o número de pessoas que morreram em determinado lugar, e que não teriam morrido, se governantes adotassem providências recomendadas pela medicina e pela ciência.

A pandemia não pode ser uma oportunidade para países se livrarem de habitantes incômodos —idosos, doentes, presos ou índios.

A investigação soberana do tribunal imaginário e utópico, oriunda do exterior, sem a proteção caseira ou corrupta de juízes locais, seria reconfortante.

A China ocultou do resto do mundo a gravidade da doença? Falsificou estatísticas? Atrasou comunicações devidas a organismos internacionais de saúde?

As falas presidenciais, suspeitas e impróprias, sobre produtos farmacêuticos supostamente eficazes, não configuram propaganda oficiosa de interesses privados?

Quantas vidas foram perdidas pelos desatinos dos ditadores da Nicarágua e do Turcomenistão? Há governantes se aproveitando do contágio para eliminar opositores?

Donald Trump desprezou informes técnicos, omitindo-se, no início da pandemia, e contribuindo para o saldo gigantesco de vítimas norte-americanas?

Mas a estrela do Tribunal Internacional da Pandemia seria Jair Bolsonaro: o governante brasileiro preso em uma cela de vidro, o olhar desafiador de psicopata, esbravejando contra os direitos humanos e contra os juízes que o interrogam, acompanhado de ministros silenciosos, amedrontados e cabisbaixos, que, deliberadamente, aderiram ao plano do Palácio do Planalto, que tem, no horizonte, as eleições de 2022.

Além de omissões pontuais que podem aniquilar a existência de gente que o presidente da República odeia, do fundo do coração, como as comunidades indígenas e a população carcerária, estimada em mais de 750 mil presos, em regime de confinamento —sem espaço, luz, água, ar, remédio, álcool em gel, luva e máscara—, ele seria réu pelo conjunto da obra.

Bolsonaro, com o estranho apoio de parcela expressiva da população brasileira, faz vigorar a falsa ideia de incompatibilidade entre saúde e economia. Na sua visão tosca, seria viável um intervalo de muitas mortes, sobretudo de velhos (e daí?), para que a atividade industrial e comercial esteja a todo vapor na hora da reeleição.

Jair Bolsonaro age com a desfaçatez do homicida que, movido pelo dolo eventual, assume o risco de matar. A “briga” de abrir o comércio é um risco “que eu corro”, ele diz. Usa a Presidência da República para promover aglomerações contra a democracia, ocultar a letalidade do vírus e subverter os esforços de isolamento social.

Obra de ficção, o Tribunal da Pandemia não existirá.

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