Carioca, jornalista, foi repórter e coordenador de produção da Sucursal do Rio. É autor de livros sobre música popular brasileira. Escreve às segundas e às sextas.
O Rio mereceu Eike
RIO DE JANEIRO - Dá raiva passar em frente ao Hotel Glória. Ou ao que era o Hotel Glória. Raiva de Eike Batista, mas não só. Raiva do Rio de Janeiro. Aqueles escombros são o reflexo do que nós, cariocas, deixamos nos tornar.
O Glória foi inaugurado em 1922 com o status de hotel mais luxuoso da América do Sul –o Copacabana Palace surgiria no ano seguinte. Primeiro prédio construído no continente em concreto armado, é um primor de beleza em estilo neoclássico.
Vizinho do Palácio do Catete e do centro da cidade, foi endereço de políticos brasileiros, autoridades internacionais, artistas importantes, celebridades mundanas. Tem uma história.
Em 2008, Eike Batista comprou o Glória por R$ 80 milhões. Queria transformá-lo num hotel seis estrelas. Arrumou dinheiro no BNDES e começou a demolir tudo, preservando apenas a fachada tombada. Arrasou um teatro, os quartos, jogou fora os móveis e quase 90 anos de tradição.
Falido, fechou a porta do cenário apocalíptico, repassou o terreno para um fundo suíço e foi embora ser classe média –após, pai exemplar, repassar sua fortuna aos filhos.
Eike representa o capital especulativo, corrosivo, que não tem compromisso com nada que não seja o ganho imediato, sem respeitar passado ou futuro. É a força da grana que apenas destrói coisas belas.
Recebedor de licenças ambientais e incentivos do Estado, cedia seu jatinho para o governador Sérgio Cabral passear, numa promiscuidade incrivelmente (até para os padrões brasileiros) impune.
Durante seu império efêmero, foi bajulado por toda a servil cidade, incluindo artistas –que iam a ele mendigar patrocínios– e jornalistas. Era um banqueiro de bicho janota, um agrocoronel poliglota.
O cadáver do Glória indica que o Rio fez por merecer Eike.
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